Por Sérgio Bernardo
Li matéria de jornal sobre Harper Lee, autora do best-seller O sol é para todos, com mais de 10 milhões de exemplares vendidos
desde o lançamento, em 1960. Mais impressionante do que a cifra astronômica (é
como se Portugal inteiro, de Cavaco Silva a um bebé – lá a grafia é esta –, tivesse lido a obra), o que espanta é
ser este, até hoje, o único título da autora. Com ele Harper Lee recebeu o Prêmio
Pulitzer de 1961 e, por conta dele, é reverenciada em seu país.
É fácil imaginar o quanto o sucesso do livro tem
pesado sobre ela. Tímida e avessa à imprensa, vive reclusa em Monroeville, no
interior do Alabama, na companhia da irmã Alice, de 100 anos (a advogada mais
idosa em atividade nesse estado norte-americano, comparecendo ao escritório
pelo menos três vezes por semana). O fato de não ter publicado mais nada pode
revelar o temor da luz que este seu sol
possa jogar sobre um outro trabalho, mas pode também querer dizer que a autora
simplesmente não deslanchou no ofício de escritora, por motivos que só Freud
talvez explicasse. Quem sabe não preferiu, em vez da difícil arte, ser
fabricante de donuts (ao contrário de
Cora Coralina, que pulou dos doces para as letras) ou apenas uma boa dona de
casa? Os que não nascem para as luzes dos refletores têm direito à sombra e ao
silêncio, e pode até ser que, caso O sol
é para todos não tivesse sido um acontecimento, Harper Lee até hoje
publicasse, com a modéstia e discrição que lhe são características. Sem
badalações, apenas escrevendo e publicando para número menos fabuloso de
leitores.
Muitos dos que escrevem hoje não se consagrarão nunca.
Ou pode ser que só sejam descobertos postumamente, como tantas vezes tem
acontecido por aí. Isso não diminui a literatura de ninguém. O que é
fundamental, escrever ou consagrar-se? Vêm à mente as palavras de uma amiga
escritora, que tem dito repetidas vezes: “Minha
intenção, ao escrever, é abrir corações e não mercados”. Já que até agora
resvalei pelo terreno das suposições, e continuando nesta linha, talvez um
pensamento semelhante tomasse Harper Lee ao pôr no papel as primeiras letras de
seu livro, que em tempo algum pretendeu um best-seller.
Com uma figura doce (tem certeza de que a senhora não
faz donuts?) que lembra muito a da
minha avó paterna, dá vontade de trazer Harper Lee para casa e ficar ouvindo
suas histórias, a primeira delas contando por que para alguns, como é seu caso,
a sombra é mais fascinante do que o sol. E por que, sendo o astro-rei para
todos, muitas vezes ele só brilha no quintal do vizinho.
Pessoalmente, acho q todo akele q escreve deve faze-lo por si msm, sempre.Escrever p os outros ou p o mercado traz o risco da prostituição das letras.
ResponderExcluirExcelent txt!
É isso, Paula, também respondo à minha própria pergunta no título: escrever! Obrigado pela intervenção valiosa, abraço!
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