quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sexo em Palavras

Por Alex Constantino

Ah Amor, assim não pode.
Ah Amor, assim não
Ah  Amor, assim
Ah Amor
Aaaah!!!   

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Delicatessen, Afuca e Porre do Caralho

Por Fabio Ramos


DELICATESSEN

Lançaram
pelo vão da porta
um bilhete

não trazia
assinatura
e era escrito
com letras
recortadas de jornais

uma
frase
bem construída
saltava do papel

a mensagem
contida nas entrelinhas
iluminou minha escuridão


AFUCA

Quis complicar por prazer.
Diante da plateia anestesiada,
Desfilou seu vocabulário pedante.
Fala empolada, citações obscuras
E erudição de boutique.
O resultado? Bocejos generalizados.

No mundo mágico do crediário,
Vagabundo assassina o idioma
Para deleite dos ouvintes.
Ignora plurais, só diz barbaridades
E orgulha-se do analfabetismo funcional.
O veredicto? Aplausos efusivos.


PORRE DO CARALHO

passou a madrugada
sozinho
tomando todas no bar
da esquina

quando saiu,
julgava ter esquecido
o motivo
que o trouxe ali

apoiando-se
nas paredes
para não cair,
tentou xingar
mas cadê a voz?

mijou no monumento
pensando que fosse
um chafariz

amanheceu na sarjeta
vomitado
sem a carteira
e tendo um vira-lata
ao seu lado

adianta
ter as chaves de casa
no bolso
sem saber como chegar?


quinta-feira, 21 de julho de 2011

Qual Foi o Último Filme que Você Leu?

Por Alex Constantino



Tenho uma ideia um pouco diferente a respeito da leitura, ou melhor, um pouco mais ampla do que aquela em que normalmente se manifesta. Acredito que não seja uma concepção original, mas confesso que não me preocupei em verificar se existe algum fundamento teórico a endossá-la.

De todo modo, é comum restringirmos o significado da leitura à atividade de buscar sentidos quando a comunicação entre sujeitos se dá através da linguagem escrita. Mas se pensarmos melhor, esse é um conceito muito restrito, isso porque existem outras linguagens que podem intermediar essa comunicação.

Aliás, penso que o que distingue - e confere autonomia - a cada forma de expressão artística é, exatamente, a existência de uma linguagem que lhe é própria.

Assim, se a leitura é a busca de sentidos na comunicação realizada por sujeitos intermediados pela linguagem, qualquer forma de arte pode ser lida. Além disso, poder-se-ia dizer que é bem diferente, por exemplo, assistir a um filme e ler um filme porque a última atividade pressupõe um comportamento ativo tentando decodificar a mensagem (ideia) transmitida através da linguagem empregada. Do mesmo modo pode acontecer em relação ao teatro, dança, música, contação de histórias etc.

E tal concepção do ato de ler não fica adstrita às artes, pois onde houver uma linguagem a serviço da comunicação de ideias haverá leitura. Daí que podemos realizar uma leitura corporal das pessoas, da sua visão de mundo e por aí vai.

É por isso que quando me perguntam o que mais gosto de fazer respondo sem titubear: ler!






quarta-feira, 20 de julho de 2011

John Lennon e Raul Seixas – Parte 3 de 3

Por Fabio Ramos


Em relação ao cinema, Lennon seguiu os passos do ídolo Elvis Presley – que estrelou diversos longas-metragens – e debutou nas telas, ao lado dos Beatles, no semidocumental “A Hard Day’s Night” (Os Reis do Iê-Iê-Iê, de 1964), dirigido por Richard Lester. O cineasta faria “Help” um ano depois e convidaria John para integrar o elenco de sua comédia antibélica “How I Won the War” em 1966. O desempenho de Lennon como ator arrancou elogios do diretor e da equipe técnica. Ele virou desenho animado no divertidíssimo “Yellow Submarine” – apesar de não ter dublado a animação – e também participou de “Magical Mystery Tour” em 1967. Já “Let it Be” (1970) exibe os bastidores da gravação do álbum homônimo e o show no telhado da gravadora Apple; na última apresentação pública dos Beatles. Exatamente nesse ano, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas criou o prêmio “Melhor Trilha Sonora de Canções” apenas para entregar à banda um Oscar por este trabalho.

Entre 1969 e 1972, John e Yoko realizaram vários filmes experimentais – como é o caso de “Rape”, “Self-Portrait” e “Erection”, por exemplo –; que foram exibidos em cineclubes ao redor do mundo. Lennon e os Beatles cogitaram filmar, ainda na década de 1960, a obra clássica de J. R. R. Tolkien: “O Senhor dos Anéis”. Segundo Dennis O’Dell, que seria o produtor da adaptação, John interpretaria Gollum, Paul McCartney faria o hobbit Frodo Baggins, Ringo Starr encarnaria Samwise Gangee e George Harrison ficaria com o papel de Gandalf (personagens que combinavam perfeitamente com as personalidades de cada beatle). Diretores como Stanley Kubrick e David Lean foram sondados para a tarefa, mas o projeto nunca foi adiante.

Em um dos versos da música “Metamorfose Ambulante”, Raul afirmava ser um ator. Mesmo nas entrevistas concedidas, ele sempre enfatizou: “Sou tão bom ator, que finjo que sou cantor e compositor e todo mundo acredita”. Depois do casamento com Gloria em 1975, Raulzito descobre que seu cunhado Jay Vaquer havia terminado um curso de pós-graduação em cinema. Com a cabeça fervilhando de ideias, o baiano viaja aos EUA com a esposa e começa a bolar o roteiro de “O Triângulo do Diabo”. Ele queria realizar um longa-metragem, rodado em 16 e 35mm, nos moldes de “Easy Rider” (dirigido por Dennis Hopper em 1969).

Na história, Raul e Gloria encontrariam o misterioso “Homem Novo”. Além das aulas de filosofia ministradas pelo estranho, o personagem entregaria a dupla um mapa indicando o caminho que os levaria ao Triângulo das Bermudas. Os protagonistas embarcariam num navio e, uma vez no local indicado, eles se desintegrariam. Em meados dos anos 1980, Raul também anunciou em entrevistas a produção de “O Edifício”. Sylvio Passos, presidente do fã-clube oficial do cantor, explica as intenções de Raulzito: “Era um filme onde cada andar do edifício retratava uma época na história da humanidade. E a grande busca era saber e/ou falar com o síndico deste prédio que, teoricamente, seria Deus”. Infelizmente, nenhum dos dois longas-metragens foi finalizado.

No disco “Novo Aeon” – lançado em 1975 –, Raul cita os Fab Four na canção “A Verdade Sobre a Nostalgia”, que retrata a rebeldia adolescente: “Mamãe já ouve Beatles / Papai já deslumbrou / Com meu cabelo grande / Eu fiquei contra o que já sou”. É inevitável não notar as similaridades entre as músicas “I Don’t Wanna Be a Soldier, Mama, I Don’t Wanna Die” e “Mamãe Eu Não Queria”; ou mesmo “Peixuxa, O Amiguinho dos Peixes”, que é igualzinha ao andamento de “Ob-La-Di, Ob-La-Da”. Talvez a grande ideia em comum entre os dois tenha sido a “Nutopia”, que lembrava muito a “Sociedade Alternativa” de Raul e Paulo Coelho (só que sem a parte mística introduzida pelos brasileiros).

Enquanto sofria a ameaça de ser deportado dos EUA, na década de 1970, John e Yoko criaram a “Nutopia” (Nova Utopia), país imaginário do qual se declararam cidadãos e primeiros embaixadores. A bandeira nutopiana é inteiramente branca – cor que simboliza a paz – e a canção “Imagine” pode ser considerada o hino nacional desta nação fictícia; que não conheceria guerras, fronteiras e nem religiões. Aliás, é creditada no LP “Mind Games”, de 1973, a faixa “Nutopian International Anthem”; onde não ouvimos nada além de silêncio (na verdade, os cinco segundos que duram essa “música” não passam de um mero espaço em branco no final do Lado A). Já a “Sociedade Alternativa” era baseada em “O Livro da Lei”, obra escrita por Aleister Crowley – o grande popularizador do ocultismo, que se autointitulava “A Besta 666”. Não é preciso nem dizer que a ditadura não deu sossego a dupla. Esperando baixar a poeira, Raul e Paulo Coelho partiram para a América em 1974.

Esta primeira viagem aos EUA também rendeu a lenda do suposto encontro com Lennon. Sobre esse “contato imediato”, Raul afirmou com um certo exagero: “Encontrei com John, ele estava separado da Yoko, num apartamento. Ele era um cara muito firme, muito rápido. Tinha o cabelo todo penteado para cima, com Brilhantina, tipo Mandrake. E um sapato branco... Ele recebeu a gente direito. Conversamos sobre figuras históricas como Calígula, Nero, Gandhi. Gente que fez história. A certa altura, ele me perguntou qual era a figura que representava o Brasil. É, perguntou, imagine, a gente falando de Homero, disso tudo. Aí eu gaguejei: Ca... Ca... Ca... Café Filho. Bicho, o cara não entendeu nada! Ficou ‘what’? ‘Coffee what’? Eu disse: nada, nada. Aí eu enrolei, entrei na conversa sobre Elvis Presley, já mudou tudo. Fiquei em pânico”. Para Marco Antônio Mallagoli, presidente do fã-clube “Revolution” e uma das maiores autoridades em Beatles no país, esse encontro nunca ocorreu. Marco declarou que “Raul tinha valor por si só e não precisaria ter inventado isso”.

Lennon e Raul tiveram finais lamentáveis. Ironia do destino ou não, o pacifista John foi assassinado a tiros por um fã psicótico em frente ao Dakota Building, em Nova York – prédio onde morava com Yoko e Sean, que serviu de locação para “O Bebê de Rosemary”, filme do diretor Roman Polanski – no dia 08 de dezembro de 1980. Raulzito, sempre abusando do álcool e dos mais variados tipos de drogas, tinha diabetes e precisava tomar insulina constantemente. Como ele não se cuidava e continuava bebendo, o baiano sofreu uma parada cardiorrespiratória no flat em que estava hospedado, em São Paulo, e faleceu em 21 de agosto de 1989 (poucos dias antes, em 02 de agosto, seu ídolo Luiz Gonzaga também morreria).

Visivelmente aborrecido por Lennon ter conseguido o visto de permanência definitivo nos EUA, após anos de pendengas judiciais, o folclórico Tim Maia – que chegou a ser expulso da América, nos anos 1950, por posse de drogas – fez a seguinte declaração (revista Pop, número 29, março de 1975): “John Lennon é uma besta e Raul Seixas é uma cópia xerox da burrice. Eles são dois quadrúpedes que só querem justificativa para curtir loucuras. É vigarice das brabas! E se alguém voltar a falar nisso, a gente acaba o papo já”. Tim, por sua vez, requentou a concepção da “Sociedade Alternativa” e tornou-se o grande propagador da “Cultura Racional” que, em termos de canalhice, deixaria qualquer Edir Macedo da vida morto de inveja. Mas isso, pessoal, já é outra história...

ASSISTA:
Julian Lennon fala sobre o pai

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Gramática do Consenso

Por Alex Constantino


Recentemente, recebi, lisonjeado, um convite para participar de um clube de leitura que se propõe a ler e discutir a cada rodada um livro escolhido por suas participantes.

Para um apaixonado pela literatura esse é um excelente pretexto para a aquisição de mais um livro, sem contar a inestimável oportunidade de conviver com outras pessoas que partilham dos mesmos interesses. E o privilégio é ainda maior quando se trata da possibilidade de integrar um grupo com quatro mulheres tão especiais.

É óbvio que aceitei o convite sem pestanejar e daí fui introduzido, sem duplo sentido, por uma delas às demais participantes. Tratei logo de me apresentar e fiquei muito feliz com a ótima recepção por parte delas, o que já era esperado se tratando de pessoas tão simpáticas.

Porém, um detalhe me incomodou um pouco e não tem nada a ver com as meninas (espero que elas não se incomodem de chamá-las assim) e, ao mesmo tempo, tem tudo a ver. Explico-me melhor.

A primeira mensagem enviada por uma delas ao grupo, depois de feitas as apresentações, começa assim: olá queridos! Também fui dar uma olhada no blog mantido pelo clube e elas atualizaram o “quem somos” para constar algo como: somos cinco apaixonados por literatura...

Fiquei constrangido porque me dei conta que a opressão das normas de gênero, mencionada pelo movimento feminista, está tão disseminada que ecoa, inclusive, nas normas de padronização da língua.

As meninas mal abriram as portas do clube para me receber e o gênero masculino se esgueirou sorrateiramente para dentro dele tomando conta do pedaço.

Muitos argumentariam que estou fazendo tempestade em copo d’água, pois se trata de um caso simples de concordância nominal em que o adjetivo concorda com a soma dos elementos, indo para o plural e no masculino porque um deles é desse gênero. Será mesmo?

Fazendo um trocadilho com os termos gramaticais, parece-me mais um caso de regência: onde o substantivo (ou pronome, ou numeral) masculino estiver, não importa se acabou de aparecer ou se estiver cercado por vários substantivos femininos (ou pronomes, ou numerais), deverá prevalecer como o soberano da frase, tomando para si todos os artigos, adjetivos, pronomes adjetivos, numerais adjetivos ou particípios. Aos termos do gênero feminino só resta obedecer e concordar, mesmo que seja uma concordância meramente nominal.

A mim, fica a impressão que as normas gramaticais estão a reproduzir e perpetuar uma perspectiva de predominância masculina. Mal ingressei no grupo e, apoiado numa regra gramatical, lá fui eu, mesmo sem querer, transformá-las em queridos e apaixonados.

Que plural é esse que nega sua própria natureza e privilegia um indivíduo em detrimento da maioria do grupo?

Talvez seja o caso de ignorar uma regra impositiva de concordância nominal e estabelecer um acordo mútuo de consciência e consenso gramatical. Se é plural prevalece o gênero da maioria. Pode ser uma afronta às normas gramaticais, mas antes ofendê-las do que às minhas novas amigas.

Portanto, meninas, nem se incomodem em usar a longa e desnecessária saudação “queridas e querido”, usem “queridas” por justiça e merecimento. E me sentirei honrado de figurar no “quem somos” do blog dentro do termo apaixonadas por literatura.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

John Lennon e Raul Seixas – Parte 2 de 3

Por Fabio Ramos


As vidas pessoais de Lennon e Raul sempre renderam inúmeras controvérsias. Em junho de 1962, John soube que Cynthia Powell – sua namorada – estava grávida. Os dois casam-se em agosto do mesmo ano (para desespero das fãs histéricas) e Julian nasce em abril de 1963. A ausência de Lennon era uma constante, pois ele vivia ocupado com os compromissos da banda. Logo após visitar a esposa e o filho recém-nascido no hospital de Liverpool, John tira férias e segue para a Espanha; acompanhado de Brian Epstein. Ele admitiria, anos mais tarde, ter tratado Julian da mesma forma que seu pai o tratou no passado. Lennon conhece a artista plástica Yoko Ono em 1966, durante uma exposição dela em Londres. Nascia ali uma amizade que virou romance em 1968 – apesar de ambos estarem casados na época. Cynthia descobre o adultério e pede divórcio.

O casamento com Yoko acontece no ano seguinte, em Gibraltar, para quem o então beatle compõe “The Ballad of John and Yoko” e “Don’t Let Me Down”. O casal não se separava nem mesmo nos ensaios dos Beatles (os palpites de Yoko deixavam Paul bastante irritado). Grande parte dos beatlemaníacos ainda hoje a culpa pelo fim do grupo. Reza a lenda que a sugestão para Lennon abandonar a banda partiu dela. Em 1971, os dois estabelecem residência em Nova York e enfrentam diversos problemas com a imigração americana – e até com o FBI, que não via com bons olhos as manifestações pacifistas da dupla. Para surpresa de todos, John separa-se de Yoko em outubro de 1973; mudando-se para Los Angeles. Eles passam 15 meses separados. O relacionamento é reatado em 1975 e a japonesa engravida mais uma vez de Lennon (sendo que, anteriormente, Yoko sofrera dois abortos).

John relega a carreira artística a um segundo plano. Sean, seu segundo filho, nasce em 09 de outubro de 1975 – mesmo dia em que Lennon completava seu 35º aniversário. Embora sem herdar o talento do pai, as duas crias do ex-beatle também enveredaram pela música. Curiosidade: Sean adora os Mutantes (a arte gráfica do álbum “Technicolor”, lançado em 1999, é de sua autoria). Quando se apresentou no Rio de Janeiro, durante o Free Jazz Festival de 2000, Sean convidou Arnaldo Baptista para uma canja em seu show. Julian, por sua vez, fez uma ponta como garçom no filme “Despedida em Las Vegas”, com Nicolas Cage. É assustadora a semelhança física entre ele e Lennon. A propósito, vocês já repararam como John é idêntico ao cangaceiro Lampião, com seus óculos redondos e nariz torto?

Há quem diga que Raul nunca amou outra mulher da mesma maneira que a americana Edith Weisner, sua primeira esposa. Filha de um pastor protestante, ela conheceu Raulzito em 1966. Como os pais religiosos da garota eram contra o namoro, o baiano teve que entrar na linha: ele concordou em dissolver os Panteras e fez supletivo para concluir seus estudos. Passando no vestibular da Faculdade de Direito, Raul casou-se com Edith em 1967. Simone, sua primogênita, nasceria três anos depois. O matrimônio durou até 1974, quando Edith partiu repentinamente para os EUA – levando Simone junto. É provável que ela tenha descoberto o romance do marido com Gloria Vaquer, a irmã americana de Jay Vaquer (um guitarrista que Raulzito conheceu nos tempos da CBS); mas o fato é que, pouco antes de se separarem, ele já vinha abusando do uso de bebidas alcoólicas.

O casamento com Gloria ocorreu em 1975. Raul se tornaria pai novamente em junho do ano seguinte, com o nascimento de Scarlet. Vendo a mesma história se repetir, ele é afastado de mais uma filha quando Gloria retorna à América em 1977 – após o fim do relacionamento entre os dois. Raulzito ainda conviveu com Tânia Menna Barreto (na segunda metade dos anos 70) e com Ângela Costa (mais conhecida como Kika Seixas, entre 1979 e 1984). Kika é a mãe de Vivian, a terceira cria do Maluco Beleza, nascida em maio de 1981. Nos últimos anos, ele também teve um breve romance com a jornalista Helena Coutinho; para quem escreveria a debochada “Você Roubou Meu Videocassete” – canção do LP “A Panela do Diabo”, lançado com o parceiro Marcelo Nova em 1989.

O sonho de Raul era ter um filho homem. Segundo o próprio, um certo “problema de genes” o impossibilitava de ser pai de uma criança do sexo masculino. Por essa razão, ele declarou em entrevistas sua intenção de adotar um menino (fato este que, na realidade, nunca se concretizou). Das três filhas, a única que tem uma relação direta com o meio musical é a caçula Vivian, que atualmente é DJ. Simone trabalha como bióloga e Scarlet é dona de casa.

A literatura e o cinema fizeram parte da vida de ambos. Em pleno auge da Beatlemania, John escreveu dois livros: o primeiro, publicado em 1964, chama-se “In His Own Write” e o segundo, lançado um ano depois, foi batizado de “A Spaniard in the Works”. Essas duas obras foram compiladas em um único volume para a edição brasileira; traduzidas pelo poeta Paulo Leminski e publicadas pela Brasiliense com o título de “Um Atrapalho no Trabalho”. Raulzito herdou do pai o gosto pela literatura e, ainda na infância, ficou fascinado com “Dom Quixote de la Mancha”, “O Tesouro da Juventude” e “O Livro dos Porquês”. O roqueiro baiano publicou o seu “As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor”, pela Shogun Editora, em 1983. A companhia pertencia ao antigo parceiro Paulo Coelho que, naqueles dias, nem pensava em ser o escritor brasileiro mais vendido no mundo.

Na terceira e última parte da saga, confira o interesse de John Lennon e Raul Seixas pelo cinema, a similaridade musical e o interesse de ambos pelas sociedades utópicas. Aguarde!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Sobre mim

Por Alex Constantino

Estudei escondido no prédio onde funcionava um colégio para meninas, mas só porque minha madrasta vendia doces lá. À noite, estudei francês com um padeiro imigrante.
Meu interesse pelos livros foi precoce. Aos 15 publiquei meu primeiro soneto, época em que comecei a frequentar a livraria do Paula Brito e sua Sociedade Petalógica. Publiquei uma pitada de romances, um bocado de contos e um punhado de crônicas.
Bem, na verdade gostaria de ter feito essas coisas, mas fico feliz que Machado  as tenha feito.
Acho que sou como ele, um daqueles homens que nascem para ser póstumos. Tudo bem, porque sempre digo que aquilo que não me destrói fortalece-me.
Sou um apreciador da arte e, além da literatura, amo a música porque sem ela a vida seria um erro. Ela me faz dançar e aqueles que quiserem que me chamem de louco, pois tenho dito: aqueles que forem vistos dançando só podem ser julgados insanos por aqueles que não podem escutar a música.
Em mim a literatura e a música se transformam num par de asas que me elevam acima dos desventurosos e quanto mais eu subo menor eu fico aos olhos de quem não sabe voar. Se têm medo de buscar as alturas do conhecimento, deixem-me sozinho. E não me roubem essa solidão sem antes me oferecer boa companhia.
Bem, na verdade não fui eu quem disse todas essas coisas. Quero minha própria própria frase em itálico, numa bela moldura em aspas, mas, por enquanto, tomei emprestado as de Nietzsche .
Mas, por falar em companhia, não posso me queixar de algumas delas. Às vezes me reúno com Hitchcock , Kurosawa , Altman , Wilder e tantos outros. Eles contam tantas histórias maravilhosas, cada qual se gabando de como flertaram com a bela filha dos Lumière .
Tudo bem, confesso, não me reúno com eles, mas compartilho seu amor. Fico  espiando-os e aprendendo com eles porque, um dia, eu também gostaria de flertar com aquela musa.
Desculpem-me se não foi uma boa apresentação. Não sou eu em nada do que está acima, mas, mesmo assim, encontrarão um pouco de mim em tudo ali.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

John Lennon e Raul Seixas – Parte 1 de 3

Por Fabio Ramos


Tanto John Lennon quanto Raul Seixas eternizaram suas vidas através das canções que escreveram. Ambos souberam utilizar a música como uma ferramenta para externar seus pensamentos. Por focarem em temas universais, a obra dos dois ícones continua atualíssima (servindo de referência para as novas gerações). Sem desmerecer nosso saudoso Maluco Beleza – que jamais negou a influência de Lennon –, é possível enxergar semelhanças entre a trajetória deles. Vale salientar que Raul não alcançou o sucesso internacional do famoso beatle. No início dos anos 1980, o compositor brasileiro comentou sobre o álbum “Opus 666”, que traria versões em inglês de antigos hits e seria lançado no exterior. O projeto não vingou, mas parte dessas gravações podem ser conferidas no CD “Documento” (editado postumamente em 1998).

A cidade de Liverpool, na Inglaterra, sofria um violento ataque aéreo dos alemães em 09 de outubro de 1940. Ironicamente, nascia na mesma data o pacifista John Winston Lennon. O “Winston”, sem dúvida nenhuma, era uma homenagem ao estadista britânico Winston Churchill. Anos mais tarde, ele mudaria seu sobrenome para Ono. John realmente não teve uma infância das melhores: rejeitado pelos pais, Alfred Lennon e Julia Stanley, o garoto foi entregue à tia materna Mimi; que o criou como um filho. Alfred trabalhava como garçom em embarcações marítimas – e passava longos períodos fora de casa. Julia, por sua vez, raramente o visitava.

Alfred reapareceu quando John tinha por volta de cinco anos. Dessa vez, ele estava de mudança para a Nova Zelândia e pretendia levar o filho junto. Alfred e Julia brigaram. No último minuto, John acabou ficando. Julia conheceu outro homem, foi viver sua vida e devolveu o menino à Mimi. Com o passar dos anos, Julia aproximou-se mais de John chegando, inclusive, a presenteá-lo com uma guitarra (ela, que sabia tocar banjo, ainda ensinou os primeiros acordes ao garoto). Justamente nessa fase de reaproximação, Julia morre atropelada por um ônibus em 15 de julho de 1958. O descaso dos pais inspirou a canção “Mother” – inclusa no LP “Plastic Ono Band”, de 1970 (seu primeiro disco solo). Sobre a mãe, John também escreveria as músicas “My Mummy is Dead” e “Julia” (lançada em 1968 no Álbum Branco dos Beatles).

Com uma infância totalmente oposta à de Lennon, Raul Santos Seixas nasceu no dia 28 de junho de 1945, em Salvador. Ele sempre enfatizou ter nascido no ano em que as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki foram destruídas pela explosão da bomba atômica. Seus pais formavam um típico casal de classe média: Maria Eugênia (conhecida por sua personalidade forte) era uma “dama da sociedade” e Raul Varella Seixas era engenheiro da estrada de ferro (o fascínio por trens inspiraria Raul a compor a canção “O Trem das Sete”). Raul Varella também foi poeta e seresteiro. O filho cantor chegou a gravar composições do próprio pai, como é o caso de “Minha Viola” (do excelente “Abre-te Sésamo”, de 1980) e “Coração Noturno” (do auto-intitulado “Raul Seixas”, de 1983).

Apesar de viverem tão distantes um do outro, os dois jovens compartilharam a mesma identificação pelo rock’n’roll. Ao tomarem contato com aquele ritmo incendiário, suas vidas mudaram drasticamente. Por ser uma importante cidade portuária, Liverpool tomou conhecimento do novo estilo musical pelas mãos dos tripulantes ingleses. Eles viajavam para os EUA e retornavam à Inglaterra com os primeiros discos de Elvis Presley, Fats Domino, Chuck Berry e Jerry Lee Lewis (Lennon declarou que nem conseguia falar quando ouviu “Long Tall Sally”, de Little Richard). Raul morava ao lado do consulado americano em Salvador e foi apresentado à novidade pelos filhos dos funcionários da representação estrangeira. Junto com Waldyr Serrão, seu colega de infância, funda o “Elvis Rock Club” em 1958.

O início da carreira dos astros também aponta similaridades. Sempre fazendo uso de sua liderança natural, John forma o “The Quarrymen” em 1956. Paul McCartney assiste uma performance do grupo na Igreja de Woolton e encontra o futuro parceiro pela primeira vez. Lennon o convida para tocar guitarra-base na banda e Paul aceita. Mais tarde, McCartney traz o exímio guitarrista George Harrison. John convence o amigo Stuart Sutcliffe a tocar baixo com eles. O baterista que os acompanhava, Tommy Moore, logo é substituído por Pete Best. Antes de escolherem o nome “The Beatles” – um trocadilho formado com as palavras “beetle” (besouro, em inglês) e “beat” (batida) –, ainda batizam o grupo como “Johnny and the Moondogs” e “The Silver Beetles”.

No início da década de 1960, Stuart abandona-os e Paul assume o baixo. Os inúmeros shows no “Cavern Club” chamam a atenção do empreendedor Brian Epstein; proprietário de uma loja de discos próxima ao clube. Ele é aceito como empresário dos Beatles e o baterista Ringo Starr fica com o posto de Pete. Com essa formação, eles fazem um teste para a gravadora Decca e são recusados (os executivos da companhia afirmaram que bandas com guitarras estavam em franca decadência). Devido à persistência de Brian, os quatro rapazes são contratados pelo selo Parlophone – da gravadora EMI – e, daí por diante, qualquer pessoa é capaz de contar o que aconteceu. Depois de anunciado o fim do sonho, em abril de 1970, Lennon segue carreira solo.

Raul também não fica atrás e cria “Os Relâmpagos do Rock” em 1962. No ano seguinte, o grupo passa a se chamar “The Panthers”. Em meados de 1964, eles recebem o nome definitivo de “Raulzito e os Panteras”. Foi exatamente nessa época que o roqueiro baiano escutou “I Want to Hold Your Hand” e ficou alucinado. Sobre esse acontecimento em especial, o próprio declarou: “Fundei os Panteras pela necessidade de dizer coisas, de fazer rock. Mas, na verdade, foram os Beatles que me deram a porrada. Quando os ouvi, pensei: esses caras estão cantando realmente a vida deles, estão dizendo o que há pelo mundo, o que pensam. Então, eu posso fazer a mesma coisa, dizer exatamente o que penso em minhas músicas. E com os Beatles descobri que o rock podia ser usado como um veículo. Não havia percebido isso antes. Eu usava o rock como uma revolta, uma revolta irracional. Mas os Beatles canalizaram a coisa e mostraram o outro lado de tudo. Me disseram: vai, entra na máquina, entre na ratoeira, vá lá e faça. Curta”.

Raul e seus colegas acompanham Jerry Adriani (como banda de apoio) em 1967, durante uma turnê do cantor pelo Norte/Nordeste. Eles resolvem tentar a sorte no Rio de Janeiro e lançam pela gravadora Odeon, em 1968, o fracassado “Raulzito e os Panteras”. O álbum continha até uma versão em português de “Lucy in the Sky with Diamonds”; escrita por Raul e intitulada “Você Ainda Pode Sonhar”. Não suportando as dificuldades financeiras na Cidade Maravilhosa, todos voltam a Salvador. Dois anos depois, Raulzito conhece o diretor da gravadora CBS – Evandro Ribeiro – na Bahia, que o convida a ser produtor. Com uma situação financeira mais estável, ele retorna sozinho ao Rio e produz vários LPs de sucesso para artistas da Jovem Guarda.

Aproveitando uma viagem do presidente da CBS em 1971, Raul reúne alguns amigos no estúdio e grava sem autorização o que seria seu segundo disco, chamado “Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das Dez”. Evandro exige que Raul decida-se entre o cargo de produtor musical ou de cantor. Como era de se esperar, a escolha pela carreira artística custou o emprego na gravadora. Em 1972, a Rede Globo promove o VII Festival Internacional da Canção. Raulzito inscreve as músicas “Let Me Sing, Let Me Sing” (uma fusão do rock de Elvis com o baião de Luiz Gonzaga) e “Eu Sou Eu, Nicuri é o Diabo”. Após ter as duas canções classificadas no festival, Roberto Menescal convence Raul a assinar contrato com a gravadora Philips/Phonogram. O esperado sucesso ocorre quase um ano depois. Sobre a fase como produtor da CBS, ele relembraria: “Como os Beatles, que aprenderam no estúdio, eu aprendi tudo na CBS, os macetes todos. Aprendi a fazer música fácil, comercial, intuitiva e bonitinha, que leva direitinho o que a gente quer dizer”.

No próxima quarta, confira as similaridades entre a vida pessoal de John Lennon e Raul Seixas; além da relação de ambos com a literatura. Aguarde!