quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Pequena via

Por Fabio Ramos




na sombra


não
se


no escuro


não
de


ser
para vós


que
quer


holofotes


(...)


em
seu
casulo


a demonstrar


como
age:


se nada fala


ao
ego


(DESCARTA)


e
se
bajula


de
vez


AÍ ABRAÇA


(...)


mas
não


ousa proferir:


quem
vai
brigar


pelo último lugar?


(...)


se
tal


nobreza


de
você


jamais partirá?

terça-feira, 29 de setembro de 2020

Everest

Por Denise Fernandes




Você é o meu Everest

sorte poesia caminhada

força fé lua na estrada

caderno caneta e mais estrada

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

atresia

Por Ana Paula Perissé




escolhi parar.
porque sem brisa de
víscera
te recordo
cada entranha
de corte súbito


cada veia
que criou desvio
em fuga
do mais puro
desvario.


(foge vulto
sepulta umbra


(passa rápido.
hesitação de 1´vida
é abertura ou
quase0)


tendendo in infinitum,
nulla.

domingo, 27 de setembro de 2020

Gabriel

Por Oswaldo Antônio Begiato




Gabriel, menino dos cabelos cacheados
Como ondas de um mar desejado
Onde outros meninos surfam tranquilos
Em pranchas feitas de presente e meiguices,
Vem e deixe-me abrigar em teu colo farto
E te devolverei a pipa que nunca roubei de ti.


Gabriel, menino dos olhos adultos
Cheios de uma inquietação infantil
Onde eu, homem, aprendo a ser menino,
Não se preocupe com o raio cruel e ruidoso
Que queimou a televisão velha e cansada
No dia em que a chuva te fez adormecer.


Gabriel, anjo de novo encarnado, aqui bem perto,
Na pele doce herdada do cantador negro e luzidio
E da branca mãe que zela pelos teus tenros passos,
Vem, deixe-me adormecer no teu colo, ouvindo a chuva
Sem que eu me amedronte com os trovões e os raios.
Vem Gabriel, vem velar o meu sono atribulado!

sábado, 26 de setembro de 2020

Filigrana

Por Meriam Lazaro




Com fios de ouro ela tece
A rede de seus amigos
Na imensidão que amanhece
Seus lírios desconhecidos


Ao sol do Amor que aquece
Ponto a ponto o bem precioso
Suas preces que enternecem
E chegam ao Deus grandioso

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Para o além

Por Nana Yamada




Você me faz rir à toa
O tempo todo
Me pego sorrindo sem razão
É o único motivo
Que me faz ter
Você em mim tão suavemente...
Quero crer na sorte, na coincidência e no acaso
Quero crer que você é a realidade mais bela e esperada
Sorte minha tê-lo tão perto
E na obediência, existe a distância
Que nos une de alguma maneira
Deixando nossos rastros à mostra
Para que nenhuma barreira nos impeça
De estarmos juntos
O encaixe de nossas mãos
Nos levará para o além
Muito além do que poderíamos imaginar...

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Fome de viver

Por Fabio Ramos




esse
dia


concedido


por
Nosso


Senhor tem um gosto


de tomate
com
sal


(...)


E FICA


na
boca


para lembrar


o
quão


VALOROSO É


(...)


essa
vida


confiada


a
ti
por


Nosso Senhor


tem
um
gosto


de
torrada


com azeite e orégano


(...)


e
no
mundo


vai
ficar


PROVANDO


o
quão


AFETUOSO FOSTES

terça-feira, 22 de setembro de 2020

Contemporâneo

Por Denise Fernandes




Só ontem percebi como Zeus foi bondoso. Antes achava que havia sido injusto com Prometeu, castigando-o, quando ele só queria ser bom e generoso com a humanidade. Mas até que foi pouco aquela águia de Zeus comer tantas vezes o fígado de Prometeu.

O que o homem tem feito com o fogo? Zeus sabia que o fogo não estava em boas mãos, estando em poder dos homens. O homem é devorado pelo seu próprio fogo  e, por ser devorado, devora o ambiente à sua volta. Seu desejo, que é fogo, incendeia sua alma e inteligência.

Na grande ânsia da ambição humana, sucumbe o herói e a paz do clima. O ciclo natural em que se morre e renasce. E então, não renasce mais. Morre a espécie, enquanto o ser humano procura a cura para sua ansiedade. Como curar o homem de si mesmo? Assim, olhando a crueldade da humanidade, eu mesma me amarro em medos, suspiros, angústias estranhas. Como um vírus em mutação.

No centro de São Paulo, onde o mar de gente era o próprio pulsar da cidade, a rua Direita encontra-se vazia. Nós optamos pelo isolamento social; por mais contraditório que seja essa solidão compartilhada. Somos mais estatística que gente atualmente. Mas não me parece ruim ter me tornado estatística.

No tempo em que eu era gente, ficava muito confusa, dividida entre o medo e a coragem. Agora ficou mais fácil, porque ficou só o medo mesmo. E o sonho de uma solidão sem câmeras, uma sociedade com menos solidão.

A única concentração de pessoas que vi, respeitando o distanciamento social, assistia a uma apresentação de duas mulheres. O que faziam elas? Um amigo me disse: “estátua viva”. Porém, era mais que isso: havia essa flutuação, essa distância compartilhada por um bastão. A mulher flutuava no ar, sorrindo, e suas roupas alaranjadas se destacavam no cinza da cidade.

Em pleno viaduto do Chá, consigo rir por debaixo da máscara (e me deslumbro diante da arte). Não parecia estátua viva, pois a mulher que flutuava tinha um sorriso que não era apenas vivo, era um sorriso verdadeiro. Ela estava plena. A cidade é que parecia uma estátua de cemitério, uma estátua viva, onde os carros e o lixo circulavam sem cessar. Sim, como um retrato do contemporâneo.

Milhões de Prometeus esperam a águia de Zeus, seu castigo necessário, como um novo imposto. O fogo que arde destruindo as florestas é o mesmo que nos fará vítimas. Perdemos o dom. Mas como essas minúsculas flores que rompem o asfalto, e respiram antes que os funcionários da prefeitura venham com suas enxadas e foices, arrancando os matinhos e deixando o cinza mais cinza, lançamos nossas raízes. Tocar o ar é maravilhoso.

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

literatura corporal 2

Por Ana Paula Perissé




conte-me 1´história
com o rasgo de tuas mãos
em meu corpo.
nas extremidades de teu ser, há contos.
vozes antigas. chegue-me perto
e me cante. com tua voz rouca de ensaio
e de textos em puro atos;/
porque há pathos que se aproxima
e corrompe tuas marcas em minhas.
(há gozo&dores em fenda esgarçada)
conte-me mais e me arranhe mais
o alinhavado das minhas veias,
memórias em estado bruto:
nódoas,
ainda sem nome.

domingo, 20 de setembro de 2020

Incorrigível boemia

Por Oswaldo Antônio Begiato




os botequins
sempre abrem
abrem e fecham
fecham e abrem
os botequins
sempre
e sempre
e sempre...


e sempre há neles um cantor
com o sentimento ferido
e o coração rasgado
pelo cutelo do abandono
cantando e cantando e cantando
a canção que não se deixa findar


diferentemente de mim
que sou apenas um pobre ouvidor
e vivo reclamando da vida
horas e horas a fio
quase sempre embriagado
sentado à mesa amargurado
ouvindo e ouvindo e ouvindo
a canção que não pode se findar

sábado, 19 de setembro de 2020

Travessia de flores

Por Meriam Lazaro




É primavera,
Relevo e estação,
Motivo e semente,
Travessia de flores,
Despertar das gentes...
As aves são Marias,
Os dias, guardiões
De sabedoria e sonhos.
O pólen se dissipa e germina,
Na terra há sulcos,
Assoviam brotos e poesia.
Há uma Sofia,
Que mora contente,
Em meio ao nada
Faz versos sabiamente.
É primavera,
A anunciação
De sombras que dançam
Na esperança da luz,
Aniversário
Da Flor em botão,
O Anjo que abraça
E quer por destino
A imensidão!

quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Como eu poderia

Por Nana Yamada




Como eu poderia te transformar numa poesia?
Como eu poderia te fazer enxergar
Tudo aquilo que não sei dizer em palavras,
Tudo aquilo que eu não consigo te mostrar?


Como eu poderia evitar de não me apaixonar ao ver o encanto da lua?
Como eu poderia evitar de um sentimento não nascer,
Se o encantamento chegou antes de você chegar?
Se tudo já tinha acontecido antes mesmo de começar?


Como eu poderia não pensar?
Como eu poderia não sentir,
Se você ocupa o pensamento
De cada segundo do meu dia?


Como eu poderia imaginar que seria vítima?

quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Cautela

Por Fabio Ramos




você prefere


a boa
ou
a má


notícia primeiro?


(...)


se for
pra
remoer


melhor é não saber de
notícia nenhuma


(...)


se for
pra
saborear


melhor é degustar a notícia
o quanto antes


(...)


se for
pra
destruir


*a porta é logo ali

terça-feira, 15 de setembro de 2020

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

ensaios

Por Ana Paula Perissé




teus sonhos me erguem
em ensaios
teus devaneios,
em tua prisioneira
..só
queria avançar meu olhar em ti
feroz
e fazer morar tua imagem refletida
cá dentro do eterno
de 1´outra orla. pois com minha alma
feito carga,
quanto mais ardor
mais espanto
de luar
sem sol
.
..apócrifa.

domingo, 13 de setembro de 2020

Palavras mudas

Por Oswaldo Antônio Begiato




Quando você vier
apontar minhas lástimas
traga gestos calmos,
traga gestos claros,
traga gestos castos.


Quando você vier
preparar minhas cinzas
traga um quilate de ouro,
traga um ramo de mirra,
traga um frasco de incenso.


Quando você vier
encomendar minhas crenças
lembre-se de que sou
torto,
empertigado em urna de ouro;
louco,
enfeitado com folhas caducas de mirra;
poeta,
ungido com fragmentos de incenso.


Quando você vier
retalhar minha existência
traga o silêncio dos tortos,
traga o silêncio dos loucos,
traga o silêncio dos poetas.


Quando você vier
lacrar o túmulo de minha carne insepulta,
traga palavras mudas e nada mais,
pois meus versos necessitam de silêncio.

sábado, 12 de setembro de 2020

Castiçais

Por Meriam Lazaro




Quero ser o amor sem dono
Sem que me olvide jamais.
Da vida, colher o pomo
E da paixão, temporais.


Quero mergulhar no sono
Das regiões abissais,
Ressuscitar o profano
De donzelas e missais.


Quero o sonho e catedrais,
A queda de muro alpino,
Que sobressaiam os vitrais
E o luminar divino.


Quero o impossível rumo
Das bandeiras e gerais,
Para o despertar soturno
De um tempo que se esvai.


Quero as cinzas deste inverno
Guardadas em castiçais,
Onde em plenilúnio eterno
Em meus braços tu estarás.

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Meu amor

Por Nana Yamada




Meu amor,
Talvez você não queira acreditar
Que eu sempre esperei por você
De todas as pessoas que conheci
Nunca encontrei um pedaço de você


Meu amor,
Por anos procurei você
Por todos os cantos do mundo
Sempre estive na espera de você
Sempre falei de você


Meu amor,
Não sei de onde vieste
Não sei da sua história
Mas sei que a minha alma te reconhece
Sei que meu coração conhece o teu


Meu amor,
Deus nos criou para nos unir
Deus sempre me fez acreditar na sua existência
Deus colocou teu amor em mim
Foi o que Ele escolheu


Meu amor,
Acredito no nosso amor
Sei que chamas por mim
Sei que procuras por mim
Sei que estás à espera de mim


Meu amor,
Pegue na minha mão
E prometa não soltar
Nunca mais
Em momento algum...

quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Minúcias

Por Fabio Ramos




qual é a


cor
do


esmalte dela?


e
da
bolsa?


E DO CABELO DELA?


(...)


sobre
você


(nada escapa)


mas
na


mente


ele
antevê


A COR DA LINGERIE TAMBÉM

terça-feira, 8 de setembro de 2020

A cópula das mariposas

Por Denise Fernandes


Imagem: Hide Iizuka


Entrei no meu quintal, e vi algo estranho. Chamei meu filho para conferir a estranheza: duas mariposas enormes, bem diferentes entre si, na parede do quintal. Perto do centro de São Paulo, já é difícil encontrar mariposas grandes, coloridas e, ainda por cima, copulando. Em cinquenta e quatro anos, é a primeira vez que vejo duas mariposas se reproduzindo. Achei lindo. E diferente.

O noticiário traz tanta notícia ruim que a gente fica com tontura, uma angústia que atordoa. Lembrei da nova palavra aprendida: "Serendipidade quer dizer aptidão ou dom de atrair o acontecimento de coisas felizes ou úteis; ou de descobri-las por acaso".

Foi uma felicidade achar as mariposas em cópula no quintal  como a flor que brota sem a gente perceber, como a criança escondida na estante. O resto é cansaço, o luto pessoal e coletivo que se estende como as nuvens do céu. Tem também um medo feio, escuro, povoado de fantasmas. E o amor indecente que as pessoas sentem por seus carros, o barulho horrível dos motores, a saudade das mãos do amado sobre as minhas.

Enquanto as religiões enchem a humanidade de culpas, são os insetos que entendem a sofisticada lógica da existência: ovos, larvas, voos, plenitude, metamorfoses. Como a criança na estante, procuro o meu lugar.