segunda-feira, 30 de outubro de 2017

galhofas

Por Ana Paula Perissé




                                     eis a névoa, a vontade
                                     e o destino súbito
                                     eis a dor e o olhar para o antigo


                                     ( quando se reconhece
                                     a chama calva
                                     a origem
                                     se desfaz
                                     em pedaços)


                                     sem fim
                                     sem restos
                                     com rastros de si


                                     sem palavras
                                     sentenças semi-mortas
                                     que guardam a esperança
                                     ao retornar
                                     àqueles com enigmas
                                     e galhofas

domingo, 29 de outubro de 2017

Capitulação

Por Oswaldo Antônio Begiato




Não sei se ainda tenho sonhos.


Perco-os na medida em que o amor
Dentro de mim se remexe entre as cinzas
E eu o cubro rapidamente.


Penso que, com isso, deixo meu coração blindado.
E blindando meu coração, penso que não poderei mais amar.


Mas quando adormeço,
Supondo estar protegido
Pelo aço que guarda meu coração,
Ponho-me a sonhar... A sonhar!
Contigo, sempre... Sempre!

sábado, 28 de outubro de 2017

Passo

Por Meriam Lazaro




"O mundo não para!"
Eu me movimento.
Você não repara
Meu passo mais lento.
Voar, coisa rara,
Sonho que alimento...
É chegada a hora
De ir noite adentro!

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Cantigas de ninar do tempo

Por Mayanna Velame




Olhamos para o espelho e percebemos os arcos (do bigode chinês) no contorno da boca. A tristeza, disfarçada em sorriso, reluz nos semblantes. As rugas da feição franzina anunciam as pegadas do tempo; sobre a superfície árida da pele.


As pálpebras baixas, os olhos ofuscados, o delinear do rosto. A vida nos parece perecível. Lembramos da época de criança, em que tudo era permitido: sonhar, brincar, empinar pipa, voar com os aviões.


As nuvens do céu não eram gotículas de água, mas sim ovelhas  a pastorear no terreno divino. Os medos tornavam-se toleráveis: bicho-papão, cuca, fantasmas. A imaginação ajudava a vencê-los.


Para nós, ser criança significava abraçar a liberdade. Os joelhos ralados sangravam, doíam. No entanto, nenhuma dor nos intimidava a não continuar. E hoje, nossa maior angústia reside no coração. Não há pomada, spray, merthiolate ou band-aid para amenizar o que sentimos.


O tempo corre lá fora. Crescemos como árvores, florescemos, geramos frutos (bons e ruins). A criança, desprovida de preocupação, amadurece. Somos adultos. Os boletos bancários são visitantes mensais e pontuais. Aprendemos que o amor machuca; criando feridas rasas, agudas e profundas  nas quais nem o beijo da mãe é capaz de cicatrizá-las.


O fato é que, pouco a pouco, diluímos nossas perspectivas. Vamos apenas reproduzindo os sonhos já sonhados. Logo, o coração ardente adormece. Somos seres apáticos, à mercê do moralismo e das convenções. Priorizamos a presença. E a essência de viver?


Assim, esquecemos a funcionalidade e acolhemos o que desejam para nós. Como seria bom recuperarmos o olhar de criança. Ver o mundo sem medo, mágoas ou desilusões. Em algum lugar desse espaço, a nossa criança ainda existe. Pode ser nas páginas de um determinado livro, no vento que sopra, nesse balão no firmamento e até nas cantigas de ninar do tempo.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Uma vez na vida

Por Nana Yamada




Uma vez na vida,
Eu acreditei em amor à primeira vista
Me arrisquei a viver essa aventura
Um beijo de despedida que nos uniu
Dei de cara com sentimentos que não conhecia
Quem diria que aquela esquina seria fatal?


Uma vez na vida,
Eu vi que minha alma podia sorrir naturalmente
Havia encontrado o que nunca tinha achado
Sua existência já me bastava
Dei de cara com o vizinho da minha vida
Quem realmente poderia explicar o que sentimos?


Uma vez na vida,
Eu me encontrei perdida em seu mundo
Você pegou na minha mão e levou-me nessa loucura sem saída
Naquela chuva que molhou nossas almas
Você era a realidade que eu sempre sonhei
Vamos deixar de nos evitar? Quando é que vamos nos entregar?


Uma vez na vida,
Eu voei ao encontro dos seus abraços
Por você, eu recomeçaria todas as vezes
Por esse amor, eu me entregaria pela vida inteira
Não quero que se vá  sem, ao menos, tentar
Por que não vem ficar comigo, dessa vez para sempre?


Nem que seja uma vez na vida...

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Assim machuca

Por Fabio Ramos




pressiona
a ferida


não
por
descuido


com o joelho
na
quina


pela
mesma razão:


prazer
em
fustigar


prazer em lesionar


prazer na
dor


(...)


almejando
para
si


(uma overdose)


que
alcança


outras pessoas


(...)


quis
um


PROGNÓSTICO


o nome
da
disfunção


(...)


em sua
vida


(entrementes)


pôde
especular

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

barulho do silêncio

Por Ana Paula Perissé


Imagem: Carrie Graber


                                 e o barulho que o silêncio se fez
                                 nesta noite
                                 brilha e arfa em mais puro ardor
                                 de que nasça, de novo
                                 de que porte a scintilla
                                 de novas chamas


                                 Incandesçam-me!


                                 quando a chuva e o sereno chegarem
                                 quando meu filho sorrir
                                 e eu me visitar de mata
                                 largando o pouco do que tenho
                                 no corredor das minhas pernas
                                 já cansadas,


                                 estiramentos
                                 de barro molhado
                                 é molda sem falha
                                 à mesma estrada
                                 do início,


                                 do sempre
                                 eterno.

domingo, 22 de outubro de 2017

Circo

Por Oswaldo Antônio Begiato


Cena do filme "Asas do Desejo" (1987)


No chão o palhaço
No ar bela trapezista.
Poesia no arame.

sábado, 21 de outubro de 2017

Eu tenho um sonho

Por Meriam Lazaro




Risca o céu o avião!
Serpenteia em arco breve
Encimado por brasão...
Lua branca, ultraleve.
Pisca a torre de TV,
Com fragata, seus fantasmas.
Uno as mãos pra agradecer.
Peço ao Sol que me revele.
Terei eu a direção,
O timão da minha vida?...
Singrarei calma porção?
Mar bravio em despedida?
Já não tenho tanta escolha.
Não são fartos os meus anos.
Casto outono... Caem folhas.
Que importa? Eu tenho um sonho!

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

14 Bis

Por Mayanna Velame




Ele conquistou
O lar dos santos.
E o mundo lhe pediu bis...
Quando o 14 Bis
Atingiu o céu de Paris.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Poesias

Por Nana Yamada


Imagem: Rociel


Tive que aprender a contar minhas histórias tristes em poesia.
Porque só a poesia pode transformar qualquer sentimento em amor.
Qualquer machucado em aprendizagem.
Qualquer erro em experiência.
Qualquer confusão em paz.
Qualquer existência em inspiração.
E qualquer tentativa é válida quando feita com amor.
Tudo é válido quando o sentimento é verdadeiro.
Quem nunca se perdeu numa loucura de amor?
E fez dessa loucura um refúgio?
Refúgio para a alma, que se calou na sua ausência.
Mas, dessa ausência, não oculta que você renasce em mim.
Estando sempre presente em mim,
Nas minhas poesias...

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

A intervenção

Por Fabio Ramos




amparo
dos médicos


na
mesa
cirúrgica:


ALI


às pressas


fora
enviado


(...)


o pulsar


do
coração


(naquele monitor)


o
bisturi
no abdômen


e litros
de


SANGUE


(...)


em
pleno


(procedimento)


a equipe
ignora


UM FATO:


esse
homem


(sendo operado)


seu
padecer


fora do corpo


(...)


uma
voz
ordena:


A SUA HORA


NÃO
É
AGORA


(...)


um
aperto


no
peito
e CABUM:


ele
retorna


(de onde saíra)

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Vida

Por Denise Fernandes


Imagem: Christian Schloe


lua escondida

na mesma ferida

assim se vai a vida

tão rápida, tão comprida

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

perfume branco

Por Ana Paula Perissé




                                             verte
                                             a vértebra
                                             existencial
                                             em tua
                                             verve
                                             quase nua.


                                             vértice abissal
                                             de quantos versos
                                             há de fazer-te
                                             pura vertigem?


                                             ( vésper em sinal
                                             de crepúsculo)


                                             aos vér-sus de vereda
                                             crua.


                                             (vermute de sêmen
                                             em substância pura)

domingo, 15 de outubro de 2017

Poema rico

Por Oswaldo Antônio Begiato




Gostaria que abundantes me fossem
as palavras.
Mas elas me fogem
se fazem magras,
raquíticas,
e parcas.
(Me deixam mudo
diante desta mulher).


Gostaria que intensos me fossem
os diamantes.
Mas tenho apenas uns cristais
que se quebram quando meu olhar
os toca sem sentido.
(Me deixam pobre
diante desta mulher).


Mas tenho dentro de mim um coração,
que mesmo mudo,
bate enlouquecido
e como uma ostra vaidosa,
cria com o seu bater doído
a pérola mais linda
que já se viu.
(Me deixa como joia rara
diante desta mulher).


Me deixa como poeta
diante desta mulher.