quinta-feira, 31 de março de 2016

Simultâneo

Por Daniella Caruso Gandra




Somos simultâneos à medida que pontuamos. Nos espaços que por ora nos habituamos, exclamamos, como se por um fio estivéssemos; para sonorizar o que por dentro pausamos. 


Nas incertezas que lado a lado, aos poucos, interrogamos, nem sempre ao encontro do que esperamos, pois, ansiosos, à estaca zero retornamos. 


É quase sem querer: somos levados a compreender que não tem por que substantivar o que nos é característico. É só um jeito de ser, muito camarada, pouco rasteiro, mas ainda frágil, já que se rompe fácil. 


Embora estejamos constantemente raciocinando, é na emoção onde mais nos gostamos. Por prazer, atenção prestamos. De que adianta viver de queixumes, sem enfeitar com flores os rios que transbordamos? 


E a cada dia, nas rasas mortes que vivenciamos, como sentinelas, vamos acomodando o bem e o mal. Por dentro e por fora. Aprendendo a incluir o amargo nos momentos doces. Neutralizando o que fomos ontem.

quarta-feira, 30 de março de 2016

Why Beauty Matters

Por Fabio Ramos




os
arcos em
pedra


que
envoltos pela
névoa


(daqui)


por
este
ângulo


um
busto
com séculos
de idade


no
recinto
e na história


(...)


são
vários
detalhes


(acabamento)
(entalhes)


quando
bate
sol
feixes
perpassam
vitrais e grades


se
tem chuva
raios
e claridade


(...)


direito
que chega
às
nuvens


tão
apenas


do
passado
e no presente

terça-feira, 29 de março de 2016

Palavras

Por Denise Fernandes




palavras de amor que ficaram

ressoando dentro de mim

no ambiente burocrático

tudo parece de plástico

menos eu e as palavras.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Ciclos

Por Ana Paula Perissé


 
 
                                         a cada gole
                                         que sorvo
                                         desta vida
                                         é inicio
                                         ora é fim.
                                         toadas renovadas
                                         ao passarem
                                         em nervuras:
                                         som
                                         fúria em pessoas
                                         lascos pendentes
                                         no tempo de cada
                                         ente



                                         (só ou perdido de si
                                         há lacuna
                                         qualquer coisa de imenso
                                         plano, raso ou fundante
                                         a cada passagem plena
                                         de estrelas mundanas)

domingo, 27 de março de 2016

A Rosa de Nosso Eterno Amor

Por Oswaldo Antônio Begiato




Naquele domingo à tarde,
em que todas as criaturas
se encantavam em calcular
a Unidade Astronômica
você me encantou com a ideia
de construirmos uma flor.


Você faria o projeto
da semente, da brotação...
A mim caberia fazer
a fórmula do perfume,
e o voto de eternidade.


E nós chamá-la-íamos de
A Rosa de Nosso Eterno Amor.


Mas veio a segunda-feira
e com ela os homens frios,
com seus tratores pesados,
com suas mantas de asfalto,
nos enfeitaram com flores
construídas de plástico
e nos puseram no andor,
no andor cheio de passos,
cheio de passos alheios.

sábado, 26 de março de 2016

Falta de juízo, eu?!

Por Meriam Lazaro




Juízo é o que não nos falta. Fazemos juízo de valor sobre tudo, a todo o momento.


Este ano, por ocasião do relançamento de “Mein Kampf” (“Minha Luta”, em português), houve muita discussão sobre o mal que um livro pode causar. A discussão foi além do conteúdo, alcançando a forma utilizada pelas editoras no Brasil para divulgação comercial da obra, cujo autor – morto há 70 anos – é nada mais nada menos que Adolf Hitler.


Pelo que pude observar das discussões, contra a propaganda maciça da obra, havia a preocupação com a falta de experiência de leitura de pessoas mais jovens e, portanto, mais influenciáveis, assim como o momento de instabilidade política no país. Contra a proibição da publicação, levantou-se a bandeira da liberdade de imprensa.


Os argumentos de ambas as partes são sustentáveis. De um lado, temos a capacidade de convencimento de Hitler, que induziu milhares de pessoas de que era justo não só a morte, como o massacre de milhares de outras. Isso tudo sem televisão ou internet! Convence, também, o argumento da liberdade de expressão que todos temos, em igual medida, ou deveríamos ter.


Minha surpresa maior com os debates foi constatar que aquelas pessoas não haviam lido nem tentado ler a obra “Mein Kampf”, que está disponível para baixar gratuitamente na internet. Aí, me indaguei: quanta presunção de malignidade é válida nesse caso; em que somos conhecedores da terrível História?


Se pensar é livre, a manifestação de nossas opiniões carece de cuidados para não ferir. Citando outra obra do período do holocausto (esta, sim, no melhor sentido da transformação do pensamento), o psicólogo Viktor Frankl narra os anos vividos nos campos de concentração nazistas e o que pode apreender psicologicamente da experiência, em sua obra autobiográfica “Em busca de sentido”. Para Frankl, mesmo para os salvadores da pátria, a Estátua da Liberdade requer uma Estátua da Responsabilidade.


Quem frequenta as redes sociais, verifica – junto com o bombardeio de informações – que todos julgam a todos; transformando os meios de comunicação num gigantesco tribunal. Até há quem bata o martelo para os julgadores profissionais. Assim, juízo não é o que nos falta.

sexta-feira, 25 de março de 2016

Correspondência

Por Mayanna Velame




Cidade dos Felizes, 24/08/199...


Escrevo esta carta com tinta morta. Na verdade, nem sei o verdadeiro motivo. Não há mais o que escrever ou pensar. Tudo já fora feito, consumado, como a tempestade que avassala aldeias longínquas. Tudo acabou. Somos como dois estranhos, seres desconhecidos em seu próprio território. Não temos mais palavras para serem proferidas. Não temos mais segredos. Não temos mais planos e muito menos sonhos.


Teríamos ainda amor? Afinal, será que nos amamos algum dia? O amor não foi o suficiente para nós? O que nos bastaria? A distância? Detenho minha fraqueza nesta folha de papel, que paulatinamente torna-se testemunha daquilo que não teremos de volta: o nosso próprio tempo.


Acreditávamos no presente. Esquecíamos o passado e não nos preocupávamos com o futuro. O hoje era a nossa eternidade, o nosso infinito perfeito.


Agora estamos sozinhos, solitários. Não temos mais sorrisos para distribuir, não temos a dor para ser compartilhada. Somos apenas retalhos de sentimentos desfigurados. Transformamo-nos em fantasmas. Assombramos o que ainda deixamos insculpidos um no outro: a nossa compaixão.


Em algum lugar do mundo, escrevo essas módicas palavras. Pode ser que jamais sejam lidas ou comentadas. Porém, de alguma forma, elas se materializam (não na superfície do teu coração), mas nas linhas que se projetam retas; com começo, meio e fim. Talvez fosse melhor omitir e calar o que reside em nós. O silêncio é gritante e incômodo. Senhor absoluto da nossa falta de assunto.


Por um momento, sei bem que o amor nos salvou. Foi nossa redenção, serenidade e benevolência.


Entretanto, nada mais nos resta. Só ficaram algumas lembranças teimosas, que insistem em permanecer no âmago. Para nós, as estações do ano sempre se desenharão da mesma maneira. E os verões, antes ensolarados e repletos de alegria, já não nos importam como antes. E o mar, em sua plenitude e extensão, hoje nos batiza cinza e ferino. Junto com a solidão que nos acolhe de braços abertos.


No mais, caminhamos juntos. Fomos cúmplices dos nossos erros e acertos. Bebemos, comemos, viajamos, cantamos. Brindamos vitórias, choramos com nossas derrotas. E no final de tudo, nós perdemos.


Sim, nós apenas perdemos. Não exatamente para o amor. Mas perdemos, sim, para nós mesmos...


A caneta descansa sobre o papel. Algumas palavras reluzem sobre ele. Parecem estar vivas, lúcidas. No compasso desenfreado das horas, o fulgor se extingue. Envolvidas num envelope pardo, as palavras viram correspondência. E a correspondencia ficará entre as páginas de um livro. Guardada.

quinta-feira, 24 de março de 2016

Pétalas de Mulher

Por Daniella Caruso Gandra




Fiz um arranjo com flores que comprei por aí,
enquanto as ornava a janela, na tardinha que findava,
debrucei, em ondas neurais, a sutileza que em mim respirava,
e compreendi que sou avessa a banalidades e ao descumprimento da verdade.


Não há magia mais poderosa que a bondade,
temperança deveras buscada, mas tão pouco conquistada.
Demarquei muito mais injúrias no íntimo que em outros portos,
Aportei não raras vezes em benefício alheio, e ainda não me concluí.


Mas, hoje, algo compus, com as belas flores que escolhi,
e por mais espinhos, que assim como elas, conduzo,
é com fé que conjugo o verbo dar, porque embora um dia deixe de existir,
bastante de mim muitos vão levar...

quarta-feira, 23 de março de 2016

Com Tato

Por Fabio Ramos
 

 
 
uma pedra
de gelo
que
desliza no
peito


ela
causa
um abalo


traz
à
superfície
o que
anda no fundo
imerso


e
nunca
demonstra


tu sabes
como
provocar
sensações/reações


e como
isso acaba


o
corpo
responde


(a contento)


espelho
da
alma
em turbilhão

terça-feira, 22 de março de 2016

Liberdade

Por Denise Fernandes




tarde escura

cheia de medo

tudo é segredo

ou mar

enquanto voo

no ar destruído

da cidade,

sem saudade

do que já foi

muro história ouro

verdade

segunda-feira, 21 de março de 2016

Mimese

Por Ana Paula Perissé


 
 
                               o deserto em minha face
                               tinha sal em cada instante
                               e um cheiro de maresia
                               vitrificada por olhos de forasteira
                               é ardente indício de querência



                               cansada de falar de mim
                               olho cada grão
                               que me deixa
                               detalhes de universo
                               impregnar-me
                               de saudades



                               saudades do branco
                               a descobrir-se
                               saudades do que fui
                               ou do que nunca serei



                               saudades de sonhos negros
                               anjos disformes
                               de um tipo que nunca se esquece



                               saudades do que é maior
                               mímeses de vidas
                               que se foram
                               todas.



                               ( renascimentos aterradores de rosas)

domingo, 20 de março de 2016

sábado, 19 de março de 2016

Por que ler poesia?

Por Meriam Lazaro




Porque a poesia só se completa aos olhos de quem lê. Não é da alma daquele que a palavra se apossou (para vir ao mundo) de que fala a poesia. Sua verdade surge nova a cada vez que se toma do tempo um minuto para olhar além do cansaço.


Poesia não ocupa espaço na mente. Assim como vem, faz rir ou chorar. A poesia se dissolve; só trazendo, de quando em quando, o sentimento sem palavras.


Incrível é que, mesmo aquele que costuma rabiscar por aí versos e poemas, não tem o hábito de ler livros de poetas. Nas prateleiras das livrarias, as obras de poesia ocupam pouco espaço, perdidos que ficam no meio de outros livros.


A predileção dos leitores é mesmo pela leitura de prosa. E tudo bem. Mas será que, mesmo na prosa, buscamos ler autores independentes, experimentamos novos estilos, temos livros de cabeceira para releituras ou, quem sabe, até nos arriscamos a escrever um conto?


Editores não perdem tempo com novos autores – não sendo esses de outros meios artísticos conhecidos do público. Compreensível, uma vez que a poesia nem sempre põe pão na mesa nem dos chamados “escritores de verdade”.


Uma pena, pois, neste momento, em que o ódio corre solto pelas veias, a dúvida para com o rumo verde e amarelo de nosso País nos divide. Bom seria que os olhares encontrassem refúgio na beleza da arte poética.

sexta-feira, 18 de março de 2016

O Sol

Por Mayanna Velame




Não, não vejo o Sol.
É o Sol quem me vê
com seus filetes de raios,
que me acolhem
na minha ordinária prostração.


Não, não vejo o Sol.
É ele quem me vê.
E me guia nos momentos
da minha dor e solidão.


Não, não vejo o Sol.
É ele quem me vê.
Recolho-me em seu abraço,
na angústia ferina do meu cansaço.


Não, não vejo o Sol.
É ele quem me enobrece.
No entardecer e na melancolia,
que logo cedo amanhece.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Desapego

Por Daniella Caruso Gandra




Quando é cedo ou tarde pra deixar de amar?
A época não importa pro tempo de agora.


Primaveras trazem novas folhagens,
Reverenciam arestas incalculáveis,
Semeiam caminhos...
E todos trilham sozinhos.


Mas e o amor que poucos já estiveram a zelar?
Não é mais consternação nesta findável constelação.


Pois nasceu de um verão efêmero, rito de fugacidades mil.
Um bombardeio de emoções trepidantes.
Um elencar que se torna, por ora, pedante num peito hostil.


Quando dirimir o que no outro já cessou?
Abortar toda ternura num coração que ainda pulsa?


Não sintonizam mais a mesma estação.
A temperatura pouco amena é fria.
Arredios, como desconhecidos,
Apartando o que antes era tão...

quarta-feira, 16 de março de 2016

Derradeiro

Por Fabio Ramos
 

 
 
recheio de
carteira
que


(mingua)


faz as contas
e mesmo
assim


(evapora)


do
vazio
que ficou


(lamúria)


até
cair
o próximo


(salário)

segunda-feira, 14 de março de 2016

rubi

Por Ana Paula Perissé


 
 
                                      não temo rubis
                                      disfarçados por encontros
                                      hostis



                                      desci e desci
                                      ao farfalho de vespas
                                      e pouco encontrei-me



                                      (os escombros que nos fazem
                                      parte
                                      estão-me à mostra
                                      rindo-me
                                      pele)



                                      não temo rubis
                                      escarlates
                                      vigilantes de 1´amor
                                      cujo preço é
                                      o sussurro no inaudito
                                      à linha do horizonte



                                      tem muito céu, as vezes
                                      e muito pouco de mim.

domingo, 13 de março de 2016

sábado, 12 de março de 2016

Veludo

Por Meriam Lazaro




A noite vem e se aveluda.
Hoje não tem estrelas!
A lua? Ah, a lua vaga longe daqui.
As horas vão e se amiúdam.
Logo dão mote aos sonhos...
Grafitados, coloridos, vagos sonhos.
E eu?
Cansado de entardeceres,
espreito a madrugada...
Velho cuco na parede.

sexta-feira, 11 de março de 2016

quinta-feira, 10 de março de 2016

Existência

Por Daniella Caruso Gandra




Viver é um mistério. Um segredo que se compartilha para além do tempo. E ainda desconhecemos um jeito de compreender. E alongamos, por muitos nascimentos, o fim desse mistério. 


Aquilo que a vida sabiamente oculta divide o que somos, classificando-nos, pois a ela somamos escolhas (omitindo o sentido do que recortamos). 


Sem que atentemos, multiplicamos acontecimentos reincidentes porque incitados pela alma precisada do florescer. Erramos quando achamos que acertamos, já que humanos somos. 


Por isso, é fundamental recolhermos nossa história, de forma a miná-la em nós, até que se evapore por completo – e que, pela doçura do fenecer, mais serenos fiquemos.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Indo além

Por Fabio Ramos
 

 
 
do
parapeito
ao
redor


o entorno


do
conceito
ao
papel


o registro


se
ela
controla


(não suscita)


vem
sem filtro
num
dia
em suspenso


ata
desata


sem
pré
condições


(por trás da couraça)


aceita o
que
tem


aceita
de
um outro
alguém


e
na
curva
siga TAMBÉM

terça-feira, 8 de março de 2016

Estrada

Por Denise Fernandes




Estradas fechadas

te disseram para parar

e você continuou

sem saber que haveria

um muro depois de outro muro

muitas palavras

poucos leitores

dúvidas um abismo

uma biblioteca livre

o tempo parando

parece que estamos num filme

será comédia será drama

ou é só uma estrada e uma poesia.

segunda-feira, 7 de março de 2016

em sendo, quase

Por Ana Paula Perissé


 
 
                                       sou hoje perplexa
                                       como se tivesse
                                       perdido
                                       1´gota de tarja preta
                                       sou-me lúcida
                                       outrora
                                       já que de tantas
                                       coisas que vi
                                       enterrei-as quase
                                       todas
                                       para bem viver.



                                       ( 1´sintoma sempre aparece).



                                       sou hoje um tosco
                                       de tudo
                                       que ousei engolir
                                       de cara limpa
                                       para tentar te olhar
                                       de soslaio.



                                       ( o lobo de ti
                                       é a minha ausência
                                       quase sã)



                                       ( todo lugar da noite
                                       fica cheio de
                                       passado)