Por
Mayanna Velame
Cidade dos
Felizes, 24/08/199...
Escrevo esta
carta com tinta morta. Na verdade, nem sei o verdadeiro motivo. Não há mais o
que escrever ou pensar. Tudo já fora feito, consumado, como a tempestade que
avassala aldeias longínquas. Tudo acabou. Somos como dois estranhos, seres
desconhecidos em seu próprio território. Não temos mais palavras para serem
proferidas. Não temos mais segredos. Não temos mais planos e muito menos
sonhos.
Teríamos ainda
amor? Afinal, será que nos amamos algum dia? O amor não foi o suficiente para
nós? O que nos bastaria? A distância? Detenho minha fraqueza nesta folha de
papel, que paulatinamente torna-se testemunha daquilo que não teremos de volta:
o nosso próprio tempo.
Acreditávamos no
presente. Esquecíamos o passado e não nos preocupávamos com o futuro. O hoje
era a nossa eternidade, o nosso infinito perfeito.
Agora estamos
sozinhos, solitários. Não temos mais sorrisos para distribuir, não temos a dor
para ser compartilhada. Somos apenas retalhos de sentimentos desfigurados.
Transformamo-nos em fantasmas. Assombramos o que ainda deixamos insculpidos um
no outro: a nossa compaixão.
Em algum lugar
do mundo, escrevo essas módicas palavras. Pode ser que jamais sejam lidas ou
comentadas. Porém, de alguma forma, elas se materializam (não na superfície do
teu coração), mas nas linhas que se projetam retas; com começo, meio e fim. Talvez
fosse melhor omitir e calar o que reside em nós. O silêncio é gritante e
incômodo. Senhor absoluto da nossa falta de assunto.
Por um momento,
sei bem que o amor nos salvou. Foi nossa redenção, serenidade e benevolência.
Entretanto, nada
mais nos resta. Só ficaram algumas lembranças teimosas, que insistem em
permanecer no âmago. Para nós, as estações do ano sempre se desenharão da mesma
maneira. E os verões, antes ensolarados e repletos de alegria, já não nos
importam como antes. E o mar, em sua plenitude e extensão, hoje nos batiza
cinza e ferino. Junto com a solidão que nos acolhe de braços abertos.
No mais,
caminhamos juntos. Fomos cúmplices dos nossos erros e acertos. Bebemos,
comemos, viajamos, cantamos. Brindamos vitórias, choramos com nossas derrotas.
E no final de tudo, nós perdemos.
Sim, nós apenas
perdemos. Não exatamente para o amor. Mas perdemos, sim, para nós mesmos...
A
caneta descansa sobre o papel. Algumas palavras reluzem sobre ele. Parecem
estar vivas, lúcidas. No compasso desenfreado das horas, o fulgor se extingue.
Envolvidas num envelope pardo, as palavras viram correspondência. E a correspondencia ficará entre as páginas de um livro. Guardada.
Obrigada pelo carinho de sempre, Daniella!
ResponderExcluir