terça-feira, 31 de março de 2020

Cecília Meireles

Por Denise Fernandes




E das trevas surge a luz

de Cecília Meireles

sua mão me alcança

em poesia e aliança

há em sua alma a dança

que me traz a confiança

palavras que instauram alegria

Força intensa de sabedoria

nessa nova solidão a poetisa

faz dessa ilha semente e flor.

segunda-feira, 30 de março de 2020

Girai

Por Ana Paula Perissé




        gire
        .
        não há incômodo bastante
        para o meu silêncio.
        tenho pena de homens que não dizem a verdade ao útero ido.
        aos ovários desfeitos. Da "gira" que não houve no dia do feminino-mãe:
        queima da carne & sorriso fétido.
        Teu
        .
        terei vinho em meu corpo
        e rubro-róseo em minha pele.
        alhures


        e no poema-subúrbio que te ofereço
        tem a potência que a covardia desconhece.
        há lilases
        Chances de Chanel
        e vaga-lumes com bundinhas
        acesas.


        (ah! se soubesse que já sou vida-magia)
        versos sem farsa.
        .
        e te envio o infinito,
        se puderes.
        e que te devolvam a alma,
        oro.
        .
        .
        gire.

domingo, 29 de março de 2020

Deslumbramento

Por Oswaldo Antônio Begiato




Um dia descobriu
que para trocar pneus furados
os homens contavam com a ajuda de macacos.


Sem compreender muito aquilo,
ficou encantado, mesmo assim.


Quando viu,
a primeira vez que foi ao circo,
aquele macaquinho
andando de bicicleta
e fazendo micagens pelo picadeiro
lembrou-se da perícia deles com pneus furados
e alumbrou-se eternamente.


Foi então que decidiu convicto
nunca mais deixar de ser feliz.

sábado, 28 de março de 2020

Cansaço

Por Meriam Lazaro




Vejo o cansaço na boca
Feito riso que padece
Uma febre muito louca
Deste ser que não te esquece


Mãos suaves e voz rouca
Que entre brumas emudece
A cortina branco-fosca
Que ao vento estremece


Seco o pranto enrugo a roupa
Visto o sonho que adormece
Rudemente feito estopa
À lembrança que enternece


Peço pra estrela moça
Que esta noite me aquece
Esquecendo as dores poucas
Novo dia em uma prece

sexta-feira, 27 de março de 2020

Dias estranhos

Por Mayanna Velame




Abro os olhos, entre quatro paredes. Meu coração saltita dentro do peito. Lá fora, cães latem como se quisessem conversar. Afasto as cortinas. Um dia estranho se desenha para mim: esquinas vazias, carros sem destino e aviões no horizonte (escondidos atrás das nuvens).


A vida parece rendida ao medo. Sitiada, curvo-me sobre a escrivaninha. É a minha tentativa de rabiscar a solidão. Nas prateleiras, livros perfilados testemunham o movimento da caneta, marcando o papel. Neste ermo, onde me aninho, vejo os porta-retratos em cima da mesa. Sorrio para eles. Quantas histórias por trás de uma mera fotografia? Momentos únicos, paralisados no tempo, são eternizados pelo toque de um dedo.


Sigo observando. Nunca me atentei para o globo-terrestre que enfeita a mesa. O mundo é grande, tenebroso, mas, ao mesmo tempo, gracioso. Nossa morada é composta por água, terra, fogo e ar. Como é possível tudo isso? Aqui habitamos, escrevemos nossa história, circulamos, deixamos nosso legado.


Vida que vai. E meus olhos seguem o silêncio. Não há distrações, nem qualquer tipo de diálogo. Estou reclusa. Meus pensamentos ora se abrigam no instante, ora no fato já consumado.


Nesse desnorteio, a única certeza é o amor  que sempre será infalível. Onde ele faz morada, de alguma forma, o respeito floresce. Dia após dia, a sobrevivência é necessária. Respiro palavras, sons, gestos, sentimentos. Se pudesse, eu abraçaria o mar, visitaria a lua, roubaria teu sossego e semearia em hortas inférteis.


Os dias são estranhos. Nossos passos no momento atual. O agora se despede e traz o amanhã. Na dúvida que nos sustenta, afundamos em terreno arenoso. Dentre tantos pensamentos, a vida sucumbe. Esperneio palavras, galanteio novas emoções. Do lado de lá, o pavor tenta nos neutralizar. Aqui dentro, porém, há um coração que bombeia dor (e uma prosa de amor).

quinta-feira, 26 de março de 2020

Nova caminhada

Por Nana Yamada




Você ainda pode me ouvir
Quando o meu coração grita seu nome?
Você ainda pode entender
As minhas lágrimas que caem de repente?
Você ainda me reconheceria
Mesmo que a minha aparência mudasse?


Eu ainda poderia pegar sua mão
E te arrastar para dançar comigo
Num ritmo que sempre dançamos
Pouca luz e, mesmo assim, podia ver
Que seu corpo levava o meu


Eu ainda poderia continuar
Preenchendo o silêncio
No seu mundo silencioso
Eu poderia ser a voz
Que alimentava seu coração


Mesmo que o destino tenha nos separado
Eu ainda teria o dom de ler você
Mesmo não sabendo mais nada sobre nós,
Nada restou desde então
Apenas a certeza do que é real


Realidade sem você
Perguntas sem respostas
Parei no meio do caminho
Pra começar uma nova caminhada…

quarta-feira, 25 de março de 2020

Esperança no amanhã

Por Fabio Ramos




vai chegar


até
você
o carinho
que


PESSOALMENTE


não
é possível
dar


(...)


e
vai


PERMANECER


com
você
quem


(no momento)


aqui
não
está


mas
que


(no futuro)


se
você
acreditar


certamente estará


pra
lhe


ACARICIAR

terça-feira, 24 de março de 2020

Jogo do contente

Por Denise Fernandes




Quando eu tinha 9 anos, segundo o diagnóstico da minha mãe, eu estava muito "malcriada". Uma amiga dela recomendou, então, a leitura de "Pollyanna", de Eleanor H. Porter. Amei o livro. Quis ler "Pollyanna moça". Continuei "malcriada", "respondona", porque acho que uma certa rebeldia faz parte da minha natureza mesmo. Mas a leitura me fez muito bem. E o aprendizado do jogo do contente.

No livro, a Pollyanna se fode várias vezes, mas ela sempre pensa que pode ser pior, fazendo assim o jogo do contente; que consiste em ficar feliz mesmo que esteja dando tudo errado. Jogo útil em tempos de coronavírus. Não dá para saber com o que se preocupar mais: com a crise da saúde, com a crise econômica, com a morte que pode bater na porta a qualquer minuto...

Nesse clima de terror atual, lembrei do útil "jogo do contente". A alegria de não ter tantos horários e compromissos, a orquídea linda (presente da minha filha) que resolveu desabrochar agora, o conforto de ficar em casa andando de meias pra lá e pra cá, a conversa longa sobre assuntos variados com a minha mãe, a delícia de ler um livro novo, o diálogo com meu filho, a comida saborosa que ando fazendo sem pressa. Vivendo e aprendendo a jogar.

Entre uma notícia assustadora e outra, surge um medo antigo - junto com um novo. Ando caçando as boas recordações dentro de mim: meus dois partos, a infância dos meus filhos, todo o carinho que meus filhos me deram. Minha mãe fazendo bolinho de chuva em dias de chuva, a risada do meu irmão, a risada do meu pai, ficar na cama quentinha. Abraços, abraços, beijinhos, pássaros na primavera, uma garça pescando, um pôr do sol que não terminou.

No jogo do contente, estou sempre ganhando. E todos estão. Diferente de todos os jogos na vida, o jogo do contente não acaba. Não há eliminação nesse campeonato.

Nem sempre é fácil o jogo do contente. Ele exige mais que engolir o choro, ignorar dificuldades, ou buscar eufemismos. Ele exige um olhar atento, minucioso, sensível, e cheio de misericórdia. Onde a gente ri, quando podia só chorar. Onde a gente é feliz, mesmo sem entender a dor.

segunda-feira, 23 de março de 2020

eu em outra margem

Por Ana Paula Perissé




                            o amargo da palavra por dizer-se
                            exala um perfume hábil em tocar a neblina
                            do mundo.
                            (exala, não mais)


                            queria um patins de 4 rodinhas
                            para ir-me buscar
                            logo depois de mim.
                            .
                            lá
                            onde floresce a flor da lua
                            amazônica
                            de Margareth Mee.


                            perfumes que se supunham segredos
                            cheiros que se desejaram tramas,
                            existiram em horas.


                            talvez pela textura da pele
                            a palavra diz-se,
                            inteira
                            sobre as memórias que não se fizeram,
                            ainda.


                            onde há pele,
                            a dor´língua balbucia
                            vozes em clave de fá.
                            .
                            sonata inodora de neblina nua

domingo, 22 de março de 2020

Visita esperada

Por Oswaldo Antônio Begiato


Imagem: Renoir


Quando o sol chegar
Diga que precisei sair
(Fui atrás de olhos visionários
E uma frase leviana)
Mas que logo voltarei.
Que ele, por favor, me espere.
Abra as janelas,
As portas,
Afaste as cortinas.
Ofereça a casa a ele,
Sem restrições,
E deixe-o bem à vontade,
Pois, quando eu chegar
Quero lhe dar meu corpo em carne viva
E minha umidade etérea.

sábado, 21 de março de 2020

Portal

Por Meriam Lazaro




Tempo pro amor encontrar,
Crescer, sonhar vida afora...
Semente nova brotar,
No além, saudade de outrora.


Tempo pra ressuscitar
Segredo em paixão de agora,
Quem abrir a porta verá
Um mundo todo lá fora.


Tempo pra reconquistar
O filho que sem demora
Tão pródigo voltará
Perdido em sua memória.


Tempo pra ir e voltar,
Reter, deixar ir embora...
Ponta de areia ou mar,
Portal de um tempo sem hora.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Extremos

Por Mayanna Velame




Nivelados em extremos,
equador nos alinha.
De ponta a ponta.
Contamana conta
nossos dias, enquanto
Seixas nos aponta
o traçado final.

quarta-feira, 18 de março de 2020

Peso e força

Por Fabio Ramos




na moeda


ele
tirou


do jeito que


fazem
por
aí:


azar no jogo


azar
no
amor


sorte no azar


(...)


um
vira
latão


urinou na sua
roda?


(...)


um pombo


na
sua
cabeça


mirou e acertou?


(...)


para o
alto


num
salto
(e consequentemente)


num
mergulho em
direção
ao


solo
sem


TIBUM na água


(...)


veja
para
crer:


a moeda parou em pé


e a ficha
caiu

terça-feira, 17 de março de 2020

Bandeira de outono

Por Denise Fernandes




Nos salve lindo pendão da esperança

em tudo nos dê alma de criança

símbolo augusto de sonhada paz

povo, língua, terra amada que traz

a força do teu seio de pobreza

a mistura das raças e toda a gentileza

recebe o afeto que se encerra

para além, muito além de toda terra

mais que um símbolo, um cobertor

em nosso peito juvenil todo amor

o hino decorado na infância que sei de cor

amada gente sonha e seu sono

recebe o afeto que não se encerra no outono.

segunda-feira, 16 de março de 2020

dual me..

Por Ana Paula Perissé




                          já vi tanta coisa.
                          acúmulo de tempo
                          não é de vida
                          por vezes.


                          ( montanha russa ao inverso é quase roleta.)


                          chega de água parada
                          morte nocturna
                          ou desejos demais.
                          .
                          Dual me


                          os anos machucam
                          e a cura se vira
                          por vezes
                          atrás de 1´maré de sizígia


                          deixe que o tempo
                          escorra
                          viçoso ,
                          esporro.
                          pois ainda há rubor
                          a ser sentido
                          numa espécie de ternura
                          ida.


                          (há que se ir, desnuda
                          peste e atacada
                          para poder
                          retornar
                          .
                          uma qualquer mas
                          /bemmmmm siderada.)

domingo, 15 de março de 2020

Poeta e mulher

Por Oswaldo Antônio Begiato




Tu me vens agora
Com jeito de poeta
E força de mulher.


A língua ardendo em palavras
Cauterizando todos os outros sons;
A boca cuspindo vulcões
Dentro de minhas certezas frias.


Vens com o corpo em brasa,
Avivada pela brisa feroz
De teu sexo brasileiro,
Querendo derreter
O ferro de meu coração
E transformá-lo num rio de lava.


Como poeta
Investigas meus instintos,
Fracionas minhas muralhas,
Divisas minhas resistências
E revolves meus segredos.


Como mulher
Sacodes meus nervos,
Eriças meu couro rígido,
Impregnas minhas veias com fogo
E me beijas um beijo impávido.


E sendo assim, de tal tamanho a invasão,
Que não há em mim homem que aguente tanta febre;
Então traduzo-me em carne e poesia,
Sem rimas, sem culpas,
Sem regras, sem suplícios.


Traduzo-me livremente.

sábado, 14 de março de 2020

Poemeto para Quintana

Por Meriam Lazaro




Eterno será o Porto
Que no tempo te acolheu,
Sereno olhar e rosto
Folheando um livro teu.
Carinho, palavra e gosto,
Ternura não pereceu,
Sentindo o cheiro do vento
O estribilho enalteceu.
Cidade, por acalanto,
Poema que aconteceu,
Alegretense é o canto
Que o verso amanheceu.

sexta-feira, 13 de março de 2020

Disco voador

Por Mayanna Velame




Na vitrola, o disco
repaginava nossa história...
Teu último beijo
abduziu meu planeta,
inabitável de amor.

quinta-feira, 12 de março de 2020

Esperando sua chegada

Por Nana Yamada




Aqui do outro lado do mundo
Na companhia do frio e do vinho
Procurando respostas
E soluções
Outono passou
Inverno chegou
Sinto saudades do calor
Mas o calor permanece dentro de mim
No meio da fumaça, eu acho
Os pensamentos que se movem pra cá
E pra lá vão
Música aconchegante
Relaxa mente e corpo
Assim...
Fico agora só contando os segundos
Pra sua chegada...

quarta-feira, 11 de março de 2020

Brando é o fogo, Marlon

Por Fabio Ramos




apuro
ao


passar


o
ferro


na cara amassada


só para
ver
se
dava


uma disfarçada


(...)


e
você


da frigideira


em
meio ao
óleo


dourando até ressecar


(...)


se
for


passar do ponto


deixe
os


sapatos


fora:


(assim fez um japonês)


e ainda
faz


(...)


porém


S
A
B
E
I
S


muito bem:


ao
passar
do
ferrolho


ninguém pensa e


ninguém
trai