segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O Ato de Criar

Para Rosimeire Soares 

 

Para o poeta Mallarmé, tudo que existe é para culminar num livro. Esse pensamento me fez refletir sobre a vida cotidiana, o ser humano. Sabe aquela imensa gratidão a Deus pelas bênçãos concedidas? São para se tornarem livros. Sabe aquele desejo de se casar e ser feliz para sempre? Aquela vontade sórdida de se vingar do chefe? Tudo pode se tornar livro. 
 
Já parou para pensar que o sol escaldante ou o dia chuvoso fornecem matéria-prima para as mais belas poesias? As trapaças políticas, percalços no trânsito, as mazelas sociais, o ciúme, o medo, a coragem ou falta dela. Ter filhos, não tê-los, o aquecimento global, a sustentabilidade. Tudo, mas tudo mesmo pode culminar num livro. Parafraseando o poeta francês, não se trata de poder culminar num livro. Ele é ousado e faz desse pensamento uma importante sentença: é para culminar num livro.
 
Já para o filósofo Aristóteles, o papel do poeta não é dizer o que existe, mas o que poderia existir. Então o indivíduo não precisa fazer um depoimento, uma autobiografia. Precisa mesmo é de muita coragem, pois nada do que será escrito será de cunho testemunhal, é apenas alegórico.
 
A literatura é o “entrelugar” entre a linguagem e o real, garante Compagnon. A linguagem e seu domínio sobre ela. 
 
Tudo que existe é inspiração para o livro. E quanto ao autor, ele pode mostrar sua face se quiser, mas pode ficar escondido, construindo belas paredes de letras no “entrelugar”. 
 
O ato de criar é lançar mão da coragem de materializar através da linguagem escrita seus pensamentos. É fazer com as palavras importante parceria. Saber que o viver já é um grande ápice.  
 
Será se o autor, no ato de criar, existe ou apenas acredita que existe? Será se tudo que existe pode se tornar livro ou todo livro do mundo faz existir os seres que nele habita?

Um comentário :

  1. Ótimo texto, suas considerações são boas. Para mim, escrever dá forma às ideias que antes existiam somente no reino do pensamento. O que muitas vezes, depois, pode inspirar ou servir de base para a vida de muita gente. Abraços.

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