terça-feira, 27 de novembro de 2012

Buracos Negros

Por Denise Fernandes

 
         Agora, além dos buracos negros onde somem as colherinhas, os isqueiros e os pares de meia, há o estranho desaparecimento do controle remoto da TVA em minha casa. Simplesmente sumiu, devorado pelo mesma espécie de buraco que, sei lá, resolveu experimentar e comer um controle remoto para ver como era. Ou há um buraco negro específico que só come controle remoto...

         A moça que me atendeu parecia totalmente tranquila com a situação, como se fosse super normal perder o controle remoto da televisão dentro de casa. Eu, preocupada com o desaparecimento, e ela numa boa. Feliz com o fardo de doar controles remotos; que para ela não era um fardo, era de uma alegria de viver. A atendente chegou ao cúmulo de me agradecer três vezes. Aceitei o agradecimento, mesmo sem entender muito o sentido de tanto obrigada – e de tamanha aceitação da perda.

         O que eles imaginam? Ninguém se pergunta o que acontece com os controles? Minha mãe perdeu o dela porque ele se quebrou. O meu caso é estranho porque envolve buraco negro: assim, sumiu. Pensando bem, sumiram mais coisas: sentimentos, pensamentos, esperanças, uma força que eu tinha e não tenho mais.

         Sumiram os dias de neblina em São Paulo e sumiu-se o tempo em que não ficava percebendo o tempo passar, uma inocência que eu tinha em relação à vida (esquecia completamente dela e de mim). Esse esquecimento sumiu num buraco negro. Agora só esqueço de mim quando adormeço. Mas já sonhei com buraco negro: no sonho, ainda penso e procuro colherinhas, isqueiros, um par de meias combinando, um controle remoto.

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