terça-feira, 9 de maio de 2017

Mudar

Por Denise Fernandes




O centro é indizível; só faço vaguear e escutar. Na minha solidão, escuro do personagem, o destino silencia e só escuto um centro frio, infinito, dizendo eu. É o tempo. São as luas e os sóis espumados. É você e eu na solidão da palavra; o que vai no sangue, além da razão. O que vai no sentido, além da paixão. Uma solidão de entendimento. Moras na palavra? Ou moro eu sozinha, como a solidão da espera de muitas cartas e de um cem número de palavras? Moro eu sozinha com todo meu barro e pó de cem milhões de anos, origem e escavação.

Perversão da manhã. Perversão da mão do prazer de mim. Sorte no amor, azar no jogo. Quero o azar até que esse fogo termine dentro de mim. Até que fique zero a zero, na vida e na morte, no gelo e no fogo. Até que esse azar cesse o fogo, e a morte dentro de mim.

Queria ser "de verdade", e não sou. A palavra certa: impossível, imóvel mar suspenso, antiga ilha. Digo sol, verdade, amor, amar invadindo a palavra certa. Esqueça: a palavra certa, cravada, jamais será dita.

Cola minhas mãos no teu corpo e aguarda. Te amar era uma delícia adocicada pelo não-sempre. Quero arrancar essa marca até que, de sua raiz, brote alegria. Meu mal de amor é que não cessa meu esquecimento de mim.

E a última palavra, não-dita, é renasça. Renasça como puder, nem que das cinzas surjam apenas dragões ou fantasmas.

Olho o retrato desesperado de mim, que ainda sou a "mesma". Entende minh'angústia? O fio que se partiu...

Para perguntas infinitas, infinitas respostas. Arcanjos do bem e do mal, nada sabem de mim, de ti, do resto do mundo. O silêncio é a boca oportuna do caos. Mas eu vigio: observo o movimento.

Meu coração lhe telefonou mil vezes essa noite. O tempo do nosso amor insistente, talvez inexistente, em colapso de amor. Ouça, meu coração, para não ficar assustado nem com seu ridículo, nem com sua fome. Quero você e não quero. Seu corpo é uma caverna secreta.

Mudar é seguir. Bem melhor que o nada.

No hospício do mundo, nosso amor é essa abstinência, essa vontade de dominar, essa luz. No buraco do mundo, nosso amor é água; é essa rata parindo pares de olhos inocentes, que suspiram e contaminam suficientemente o ar. Nosso amor é essa vertigem.

Nenhum comentário :

Postar um comentário