Por
Amilcar Neves*
Existem três formas de derrubar
um Presidente da República democraticamente eleito (as maneiras de fazê-lo, no
entanto, admitem infinitas possibilidades).
A primeira delas não se constitui
tecnicamente em uma derrubada do governo e se efetiva pelo repúdio majoritário
expresso nas urnas eleitorais. Se detesto o PT, os tucanos ou outro agrupamento
político, eu voto contra a reeleição do presidente ou contra a eleição do
candidato dele. O contrário disso, transparente como água límpida, é a
satisfação popular com o mandatário e com suas práticas e políticas
governamentais. Fernando Henrique Cardoso foi reeleito, Lula, depois de perder
três eleições seguidas, foi eleito, reeleito e fez sua sucessora. Nenhum
general ou marechal da ditadura foi eleito nem jamais seria reeleito. É assim
que acontece a democracia e não adianta, nem é didático, difamar, debochar ou
ridicularizar o eleito, o eleitor e o processo eleitoral: a vontade da maioria
é que deve sempre prevalecer (estamos falando de democracias). O eleito,
gostemos ou não dele e do seu partido, é constitucionalmente o Presidente da
República.
No mesmo sentido, é ridículo
forçar a associação de governos de esquerda, no Brasil ou em qualquer país
democrático do mundo, com ditaduras de verdade, à esquerda ou à direita. O
absurdo disso é que somente se poderiam eleger, em todo o planeta, governos de
direita.
A segunda forma de derrubar um
presidente se dá através do recurso constitucional ao processo de impedimento.
Fernando Collor sofreu impeachment e o Brasil não desabou. Não foi
preciso pegar em armas, nem um só tiro foi disparado, ninguém foi torturado por
isso. Outro dia, alguém comentou que "por muito menos, por causa de uma
Elba apenas, o Collor, coitado, foi cassado". Não é verdade, claro. A
caminhonete Elba foi apenas o furo no sistema muito bem montado, o descuido
operacional do esquema. Como Al Capone, nos EUA: não foi apanhado pela carreira
de gângster sanguinário, mas por sonegação do imposto de renda. Foi onde deu de
pegar o cara.
A terceira forma de derrubar um
presidente constitucional foi-me relatada em longa conversa por um coronel da
reserva. Era Brasília durante o governo FHC. Naquele período (ignoro como ficou
depois), a Capital Federal estava infestada de oficiais da reserva que atuavam
junto a órgãos públicos; sem a intermediação desses "consultores"
nenhum negócio era fechado. Ele contou que fizera parte de um comando
ultrassecreto da inteligência do Exército; na hierarquia, pouca gente sabia da
existência desse grupo de elite; na prática, ninguém conhecia seus integrantes.
- Somente os bons conseguiam
entrar! - declarou, orgulhoso.
Nas manifestações, o grupo
infiltrava gente contratada para gritar slogans comunistas. Nos
primórdios da ditadura, plantava garotas e garotos de programa, dependendo da
orientação sexual dos alvos, no apartamento de políticos, militares e até
cardeais contrários ao regime, fotograva as "ações" e extorquia as vítimas,
impondo-lhes no mínimo o silêncio, quando não o apoio.
- Naquele comício do dia 13 de
março de 1964, que deu início ao fim de João Goulart, de onde aumentou a
indignação no Ministério da Guerra ali em frente, que inspirou a Marcha da
Família com Deus pela Liberdade e horrorizou a imprensa, eu e outro capitão
subimos ao alto da torre da Central do Brasil e lá fixamos a faixa forjada de
apoio do comunismo e a bandeira vermelha com a foice e o martelo bem grandes.
*
Crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 02.04.14
Cuba não é uma ditadura de verdade? China não é uma ditadura de verdade? Coréia do Norte não é uma ditadura de verdade? Se não dá pra associar ditadura com a esquerda, como você diz, então devo presumir que os países que eu citei são ditaduras de direita? Acorda pra vida, meu amigo! Maio de 1968 já acabou há muito tempo... Supere isso e cresça!
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