sábado, 10 de dezembro de 2016

O apanhador no campo de centeio

Por Meriam Lazaro


"O Semeador", de Vincent van Gogh


Releitura vale por um livro novo – e torna um autor redivivo. No mundo das metas, do imediatismo para desfrutar novidades, como é bom destinar um tempo para refazer os passos, retomar as letras, por em revista (sob a mira de hoje) nossas impressões passadas. Em algum ponto da história, olhares atuais se encontram com a memória de outros olhos.


Holden é o personagem marco do adolescente, como hoje conhecemos, na literatura. Antes disso, não era bem pontuada a adolescência: meninos e meninas passavam direto de crianças a adultos. Pelo menos é o que diz Maria Elisa Cevasco no programa "Literatura Fundamental". Após a leitura, enriquece-me a experiência checar vídeos a respeito do livro; pesquisar sobre o autor e os bastidores da obra.


O guri é um revoltado. Seus dois amores são a irmãzinha e um irmão morto. O irmão mais velho é um babaca, que deixou de escrever boas histórias para ganhar dinheiro com roteiros cinematográficos. Os colegas do colégio são babacas, os professores são babacas, os pais são babacas. Enfim, Holden é "O Babaca" que enxerga o mal do mundo – mas jamais pensa em fazer algo para mudar as coisas. Na visão de muitos leitores, a aversão do desajustado ganha força quando sabemos que sociopatas foram encontrados de posse do livro (como o assassino de John Lennon e o atirador que tentou matar o presidente Reagan).


Quem se encanta são os leitores empáticos com a depressão de Holden, o luto sentido pela morte do irmão, a memória do suicídio de um colega e a vontade de fugir de casa – irresistível para muitos jovens. Vestir a roupa desconfortável do não querer crescer, nem ficar criança, é o passaporte para admirar a obra. Nessa vestimenta, não sabemos o limite da nossa pele (e nem da pele do personagem). Lembramo-nos de uma época distante, onde sonhávamos morar numa casa/barco, isolados de tudo, ou escaparíamos do tédio com uma viagem num disco voador.


Mais um livro que resistiu à releitura como um dos favoritos de todos os tempos. Inesquecível número 100 de 2016.


"Para ser franco, não sei o que eu acho disso tudo. Tenho pena de ter contado o negócio a tanta gente. Só sei mesmo é que sinto uma espécie de saudade de todo mundo que entra na estória".


Livro: O apanhador no campo de centeio
Autor: J. D. Salinger
Editora do Autor

Nenhum comentário :

Postar um comentário