Por
Meriam Lazaro
"Não
acho que joguem nada limpo", começou Alice, num tom bastante queixoso. "E todos brigam tão horrivelmente que não se consegue ouvir a própria
voz... e parecem não ter nenhuma regra em particular; pelo menos, se têm,
ninguém segue... e depois todas as coisas são vivas, e você não faz ideia da
confusão que isso dá".
Os
adultos que se aventuram com Alice pelo País das Maravilhas abandonam a lógica (antes
mesmo da queda no poço) ao ver o coelho branco – vestido a rigor, com um relógio na mão – dizer:
"Ai, ai! Ai, ai! Vou chegar atrasado demais!"
A
passagem pelo túnel, em si, já é uma aventura plena de alegorias; ao desconstruir
a ideia de tempo e espaço. Alice toma poções e diminui de tamanho. Come
bolinhos e cresce demais. Chora uma lagoa de lágrimas. Fala com animais e seres
que, fora do túnel, seriam inanimados (como a rainha, o rei de copas e todas as
cartas do baralho). Meu bicho preferido é o
risonho Gato de Cheshire que, num diálogo com Alice, aponta o rumo a ser
seguido:
– "Que caminho devo
tomar para ir embora daqui?
– Depende bastante de para onde quer ir.
– Não importa muito para onde.
– Então, não importa muito que caminho tome".
– Depende bastante de para onde quer ir.
– Não importa muito para onde.
– Então, não importa muito que caminho tome".
É
a chamada literatura "nonsense", muito em voga pelos ingleses da época;
com enredo aparentemente disparatado, sem nexo, cheio de trocadilhos. Diante
desse mundo maravilhoso, ficamos a pensar: o que é – ou não é – normal? Quem
teria autoridade para ditar a normalidade? Ser mais velho é suficiente para
impor algo sem significado aos demais? Bem, se não há um sentido objetivo no
País das Maravilhas, o mundo de Alice também não é muito diferente.
Confesso
que levei uma surra na leitura desse infantil, mas fiquei interessada na continuação
da aventura ("Alice Através do Espelho"). Assim como Shakespeare e
outros clássicos, sei que novas interpretações irão surgir a cada releitura.
Lembrei-me das crianças "perguntadeiras", com seus porquês infindáveis, a
embaraçar papai e mamãe. Pena que, ao final dos primeiros anos, a curiosidade silencia
– por ser considerada bobagem.
Livro:
Aventuras de Alice no País das Maravilhas
Autor: Lewis Carroll
Editora: Zahar
Autor: Lewis Carroll
Editora: Zahar
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