sábado, 17 de dezembro de 2016

Alice no País das Maravilhas

Por Meriam Lazaro




"Não acho que joguem nada limpo", começou Alice, num tom bastante queixoso. "E todos brigam tão horrivelmente que não se consegue ouvir a própria voz... e parecem não ter nenhuma regra em particular; pelo menos, se têm, ninguém segue... e depois todas as coisas são vivas, e você não faz ideia da confusão que isso dá".


Os adultos que se aventuram com Alice pelo País das Maravilhas abandonam a lógica (antes mesmo da queda no poço) ao ver o coelho branco – vestido a rigor, com um relógio na mão – dizer: "Ai, ai! Ai, ai! Vou chegar atrasado demais!"


A passagem pelo túnel, em si, já é uma aventura plena de alegorias; ao desconstruir a ideia de tempo e espaço. Alice toma poções e diminui de tamanho. Come bolinhos e cresce demais. Chora uma lagoa de lágrimas. Fala com animais e seres que, fora do túnel, seriam inanimados (como a rainha, o rei de copas e todas as cartas do baralho). Meu bicho preferido é o risonho Gato de Cheshire que, num diálogo com Alice, aponta o rumo a ser seguido:


– "Que caminho devo tomar para ir embora daqui?
– Depende bastante de para onde quer ir.
– Não importa muito para onde.
– Então, não importa muito que caminho tome".


É a chamada literatura "nonsense", muito em voga pelos ingleses da época; com enredo aparentemente disparatado, sem nexo, cheio de trocadilhos. Diante desse mundo maravilhoso, ficamos a pensar: o que é – ou não é – normal? Quem teria autoridade para ditar a normalidade? Ser mais velho é suficiente para impor algo sem significado aos demais? Bem, se não há um sentido objetivo no País das Maravilhas, o mundo de Alice também não é muito diferente.


Confesso que levei uma surra na leitura desse infantil, mas fiquei interessada na continuação da aventura ("Alice Através do Espelho"). Assim como Shakespeare e outros clássicos, sei que novas interpretações irão surgir a cada releitura. Lembrei-me das crianças "perguntadeiras", com seus porquês infindáveis, a embaraçar papai e mamãe. Pena que, ao final dos primeiros anos, a curiosidade silencia – por ser considerada bobagem.


Livro: Aventuras de Alice no País das Maravilhas
Autor: Lewis Carroll
Editora: Zahar

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