sexta-feira, 20 de junho de 2014

1986

Por Mayanna Velame




Gosto muito desse clima de Copa do Mundo. Mesmo que a nossa seja alvo de críticas – muitas das vezes exageradas e sem fundamentos. Mas, nesta crônica, não vou utilizar as palavras para protagonizar discursos hipócritas e pseudo-patrióticos.


Prefiro me refugiar à memória e recordar a Copa de 1986, quando esta cronista tinha apenas três aninhos de idade. Na época, viajei com minha mãe e meu irmão ao Rio de Janeiro, para uma temporada de um mês. A cidade maravilhosa rendia-se a um rigoroso inverno. Para mim, que sou do Norte do país, era gostoso sentir aquele vento gélido roçar minhas bochechas e afagar meus cabelos.


Lembro-me de correr, que nem uma desventurada, pelas calçadas da Praça Saens Peña. Sorrindo, eu espantava os pombinhos e me deliciava com pipocas e amendoins torrados. Melhor que isso era poder contemplar o pôr do sol, na Praia da Urca. Passear de braços dados com mamãe e vovó, enquanto meus olhos miúdos observavam as bandeirolas, com as cores da bandeira nacional, sobressaindo-se entre o céu cinzento da capital fluminense. O Rio de Janeiro lindo, na percepção de uma criança.


Mas o ápice se dava na hora de assistir aos jogos, na casa de minha avó. A cada partida, o coração era testado; a cada jogo ganho, alívio, euforia. Vovó rezava, apegava-se a todos os santos, ao Papa e a Deus. Orava o Pai-Nosso, a Ave-Maria e tudo mais que podia. Eu apenas a esquadrinhava. Não entendia nada de futebol, mas conseguia absorver aquela atmosfera, que somente uma Copa do Mundo causa naqueles que a apreciam.


Para comemorar, vovó satisfazia os desejos do nosso estômago, com guloseimas intermináveis. Milho cozido sempre foi a minha pedida. Momentos únicos que a memória guarda – e registra com recortes. Momentos como uma partida de um mundial. Inesquecíveis recordações que ecoam na mente, como um grito de gol.


Em 1986, o Brasil não ganhou a competição. Tristeza geral para todos. Inclusive para vovó, que não conseguiu esconder suas lágrimas. Quanto a mim, eu ocultei a melancolia de ter que voltar para Manaus.


Não haveria mais Corcovado, Cristo Redentor, Copacabana, bondinhos, Praia da Urca. E muito menos haveria vovó, com suas rezas e promessas. No entanto, restaram essas lembranças (imortalizadas como grandes finais, numa Copa do Mundo).

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