terça-feira, 25 de agosto de 2020

Uma tragada

Por Denise Fernandes





Domingo à tarde

Tarde duvidosa

Triste diamante:

turmalina turquesa,

Linda. Ainda ontem

Telefonei para ti.

Tento. Entretenho-me no teu destino,

Nos teus dentes. Deitada no teu peito

Desapareço, desaperto-me: pertenço a ti.

Distraio-me na tua dor, nos teus cotovelos,

Nos teus tornozelos. Dou-me no teu ventre,

Toda tua. Mas desapareço. Entre dores e apertos

Nada de ti permanece doce. Ausente,

Invento-me outra, derreto-me.

Desapareço. Traio-te.

Dá-me tua traição também.

Dá me o gosto esquerdo,

Tamanho e lento,

Distante e dissonante,

Tarde demais,

Demais triste.

Mas derrisório

Terminando rápido a tristeza triste,

Como um gato se perdendo no mundo.

Doidamente, diabolicamente;

Traio-te dizendo

O que deveria ser segredo;

Traio-te azedando o que poderia ser adocicado,

Traio-te magoada e

Ainda te traio

Quando estou triste.

Defendo-me.



Desisto.

Divido-me em duas ou três

Amantes diferentes

E não me tens nas três.

Traduzo-te em três idiomas

E não te entendo.

Temo tuas dúvidas.



Domingo à tarde,

Tarde demais,

Distante, presente e ausente,

Silente. Saudoso, dormente.

Deus.

Tava faltando Deus.

Pra história andar.



Domingo à tarde,

Tola e divina,

Hipnotizada e telepática

Alucinada em outras mentes,

Atriz.

Decido-me, desisto e insisto.

Parto deixando

Meus dedos nas tuas costas,

Meus dedos em saudades.

Dramáticas. Diretas e lânguidas.

Desenho no teu ódio

Outra ferida aberta.

Adio a felicidade

A aposentadoria

A idade certa.

Adio a sanidade

A maldade,

Ai de ti.

Adio a despedida

Num dia tão intenso

Que perdida de mim

E de ti, adoeço.

Dá-me teu perdão

E parte.

Tua parte neste resto

Neste deserto é

Só o vento da tarde,

Só a saudade.

Dá-me a saudade em doses

Delicadas.

Dá-me outra trama,

Outros tons,

Renova-te em desejos

Onde não estou.

Estreia outros trajes,

Outro penteado,

Desiste de ti.

Tenta outro jeito

De te Ter,

De reter os pedaços

Do passado.

Tira meus dedos das tuas costas:

Grudados como estrelas

São diamantes da tua terra,

Desencrava-me,

Desarma-me.

Destrói-me.

Sou um caderno de

Recordações.

Sou um dentro, tão dentro

Que dentro de mim

Não entenderias.



Domingo à tarde,

Deixa-me.

Que deixo me deixares.

Deita-me quieta,

Aquieta-me na teia

Da Terra. É este planeta

Que me tateia

E me deseja.

É teu toque que me diz:

Talvez.

Talvez um dia, uma tarde,

Talvez outro dia.

Mas o tempo não reparte a dor

Não divide o desejo:

Dá-me tudo.

Entenda-me.

Acerte.

Aceite:

Este Domingo de traição

De trauma,

É só um dia,

Um tempo

No infinito.

Uma tragada,

Uma adivinhação,

Uma noitada.

E outra tragada.

Adeus.

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