Por Mayanna Velame
O trem segue lentamente seu
destino. Pela janela, observo a tarde que se expande. Do norte ao sul. Sinto-me
bem viajando, um pássaro abrindo asas rumo à liberdade perdida. Um vento
repentino acaricia meu rosto úmido e pálido. A nostalgia me domina e me aquece.
Retiro do bolso um pedaço de papel surrado. Há um poema escrito nele. Sempre agonizo
quando o leio.
Palavras são devaneios,
êxtase. Tenho recordações de um amor que a vida e o destino souberam silenciar,
porém, não sucumbir. Poderia ter todos os amores, mas eu sei que este
sentimento é ímpar, singular. Essa unidade jamais será preenchida em meu coração. Estou
amuado porque o sol brilha lá fora. Tenho vontade de ver e tocar a chuva. A
tarde de setembro prevalece, sorrindo. Minhas costas doem e minhas pernas querem
andar. Levanto-me e coloco o chapéu marrom. Poucas vidas se fazem presentes na
locomotiva. Muitos dormem. Outros tentam ler romances. Como eu gostaria de ser
um protagonista feliz e heroico! No entanto, sou apenas o resto de nada.
Do lado externo do vagão,
esquadrinho o tempo fugaz. O sol, erguido no alto, chama a morte para o
nascimento da noite. No campo, literalmente verde, o gado pasta; norteado por
um vaqueiro valente. Deus, a valentia nunca esteve em meu espírito! O céu
avermelhado é pintura dos deuses. Em questão de segundos, estrelas brotarão no
lençol imaculado. Uma parte do meu ser se alegra. Vejo nuvens arroxeadas,
presságios de chuva, presságios do fim. O poema preso em minhas mãos. A
leitura é moldada em meus próprios sentimentos. Estou desesperado; pois sinto
falta daquilo que estes olhos jamais viram. Estou perdido em labirintos que estas
mãos criaram. Tenho desejos. Ganas de aniquilar tudo que o medo não me permitiu
construir.
Quando as estrelas dormirem,
Abra seus olhos.
Quando o sol se apagar,
Acenda sua luz.
Abra seus olhos.
Quando o sol se apagar,
Acenda sua luz.
Quando o piano desafinar,
Use sua voz e cante.
Quando o amor morrer,
Ressuscite seu viver.
Use sua voz e cante.
Quando o amor morrer,
Ressuscite seu viver.
Solto o poema no ar. Mesmo
ferido, ele voa. Suas asas recebem a vida, o espaço. O mundo lhe pertence.
Vidas inúteis lhe procuram. Vidas insanas lhe almejam. A viagem prossegue. Espero
que chova. Deus irá realizar este sonho. Eu acredito nisso! E continuo acreditando...
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