quinta-feira, 21 de maio de 2015

Um modelo de brasileiro

Por Amilcar Neves*


Tio Nico chegou outro dia, na semana passada. Tio Nico na verdade foi batizado Nicósio Osório, mas ele só atende se chamado de Nico. Porque não gosta do seu nome, preferia que fosse Nicózio Ozório, com "z" no nome e no sobrenome. Idiossincrasias. Muito comuns em se tratando de Osórios, essa gente que se espalha por todas as cidades do Sul catarinense (e só por lá) à exceção de Imaruí. Em Imaruí não se criam Osórios. A vida é assim (especialmente para eles).

O fato de morar na Capital faz de Manoel Osório (único dentre eles a recusar-se sistematicamente a voltar para o Sul) um valiosíssimo procurador plenipotenciário da família no centro do poder estadual, a despeito do visível desconforto de muitos com a teimosia do parente extraviado; de todo modo, sua casa é uma verdadeira embaixada osória, dando direito a acomodações e estrutura completa de escritório para todos que a procuram. Assim é que tio Nico foi dar com os costados por lá.

Agente federal secreto dos serviços de inteligência lotado em Criciúma, na terça-feira Nicósio Osório estava na Capital para tratar de assuntos particulares, que incluíam a compra de uma bicicleta nova para a mulher, Mariquinha Osorinha, na loja e oficina do Valdir, no Córrego Grande. Naturalmente, estacionou sua Grand Cherokee preta de vidros escuros e placas com duplo par de algarismos 5 de Balneário Camboriú (um disfarce) sobre a calçada, toda atravessada, bloqueando completamente a passagem de transeuntes.

Um pedestre reclamou da atitude dele, Nico mandou-o procurar serviço, fazer algo de útil ao invés de incomodar os outros, o pedestre insistiu na ilegalidade e no desrespeito de estacionar na calçada, Nico, rindo, debochado, falou-lhe para chamar então a polícia certo de que ela não viria, Mariquinha começou a fazer gestos obscenos repetidos gritando que faltava ao pedestre uma boa dose de intercurso carnal e, enquanto o casal se dirigia à bicicletaria, Nico puxou uma carteira, mostrou-a ao pedestre tão de longe que ele não pudesse distinguir nada e advertiu-o que tomasse muito cuidado com as coisas que faz na rua.

Mais tarde, em conversa descontraída na casa do sobrinho Manoel Osório, tio Nico mostrava-se indignado com os políticos prepotentes e corruptos que se valem da certeza da impunidade para tirarem vantagens pessoais. E arrematava:

– É por isso que este é um país de m*!

*Crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 16.06.10

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