sexta-feira, 26 de julho de 2013

O Escritor

Por Mayanna Velame

 
Um conto para escrever. Personagens a serem criados. Palavras para cativar. No entanto, minha mente apenas flutua. Acendo um cigarro, inspiro um pouco de ar que ainda me resta. No computador, a tela em branco. Passeio meus dedos entre as suas teclas, folheio dicionários, afago os cabelos. Meu gato, sobre o peitoril da janela, esquadrinha-me. Tento acariciá-lo e sua reciprocidade enobrece o meu coração. Diante de nós dois, a cidade e suas luzes iluminam as ruas vazias. Vozes longínquas ecoam em meus ouvidos. No céu, um avião se esconde entre as nuvens ruborizadas. Gostaria de vê-lo novamente, mas é tarde, ele já foge para seu horizonte.

Uma lufada de vento aviva minha alma. Sinto-me inquieto e meu gato eriça seus pelos. Estamos vivenciando a solitude noturna. E, de certa forma, somos companheiros um do outro. Parece que estamos conhecendo as angústias que nos redimem nesta noite. Estou cercado de palavras, porém não me sinto disposto para convidá-las a ingressarem no meu conto. Devo obrigá-las? Devo subjugá-las? Não sei...

Um conto para escrever. Agora, o gato sentado no meu colo, acompanha os movimentos desenfreados dos meus dedos sobre a tecla do computador. Seus olhos esbugalhados e as pupilas dilatadas me deixam eufórico.  Escrevo, penso, penso, escrevo!

A noite se alonga, fantasmas me abraçam. Sinto um calafrio. Escrevo, penso, penso, escrevo! Palavras tomam posse do espaço em branco da folha. Escrevo, penso, penso, escrevo! Sinto-me cansado, meus olhos ofuscados sentem um imensurável desejo em dizer adeus. Não, ainda é cedo, preciso terminar este conto. Antes que as sílabas que formam as minhas palavras morram e desapareçam junto com o meu coração...
 
 
O escritor desperta, os raios de sol que penetram pelas venezianas iluminam sua cama como fogo. Contrito, ele se levanta, segue em passos curtos, esfrega os olhos, boceja, tenta se dirigir ao banheiro. Mas, de repente, algo inesperado lhe acontece. Seu gato debruçado sobre o teclado do computador, digita sem parar as seguintes frases: escrevo, penso, penso, escrevo!
 

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