Por
Rosimeire Soares
Naquele dia, pude contemplar o
nascer do Sol, a pastagem seca, a vegetação desprovida do direito cabal à
fotossíntese. O calor, como eterno acompanhante daquela viagem, suscitava, além
da sede latente, um gigantesco desejo de saborear o banquete que poderia me
aguardar no lar progenitor.
Inevitavelmente fui atraída por um cheiro de gordura. Cheiro de infância.
Bolinhos fritos! Como poderia?
Àquela hora, após o estabelecer da alvorada, o convite através do olfato
tornou-se irrecusável.
Pude então pegar o bolinho frito
(daqueles de polvilho). A sensação prazerosa já estava próxima. Mordi a
referência de meus 8 anos. Quantas recordações. Fome inocente, hoje
transportada para a realidade que adverte o perigo do colesterol.
Enquanto comia, devorava, degustava
os bolinhos, meus olhos se hipnotizavam numa cena intrigante: o autor (pode-se
assim dizer) do alimento que cerceava a minha fome iniciou um importante e
solene gesto que, certamente, por também ter acontecido antes, culminou na
minha quebra de jejum.
Aquele homem, plenamente confiante
em seus atos, apossou-se de alguns copos para lavá-los. Seriam higienizados,
mas... onde?
Um importante recipiente (balde)
aguardava os copos.
A submersão desses utensílios
naquela água de cor amarelada me roubou o olhar e o paladar. O biscoito de
polvilho fora abandonado na perspectiva de me saciar, pois agora meu desejo de
conhecer o processo por que passam os copos na beira da estrada sobressaía e me
desviava o pensamento.
Os dedos furiosos continuavam
agarrados à parte interna do vidro dos copos. Aquela aconchegante água turva
abrigara muitos copos (do tipo americano) e de maneira capciosa ria dos meus
lábios afoitos. Minha saliva se misturava a demais partículas microscópicas e
uma importante reflexão eu fiz: quantas prostitutas eu beijei hoje?
A vegetação seca que fielmente continuava a me acompanhar também acompanhava os caminhoneiros, promíscuos ou não, com quem pude dividir os mesmos copos, as mesmas bactérias, a mesma insensatez, o mesmo ponto e o mesmo café.
A vegetação seca que fielmente continuava a me acompanhar também acompanhava os caminhoneiros, promíscuos ou não, com quem pude dividir os mesmos copos, as mesmas bactérias, a mesma insensatez, o mesmo ponto e o mesmo café.
Nenhum comentário :
Postar um comentário