Por Meriam
Lazaro
Costuma-se pensar a
árvore como essência feminina. Sua sombra generosa, raízes firmes na terra,
flores, frutos, semeadura para tantos. Na língua de minha mãe é assim.
Os anos passam e nos
dão oportunidade de revermos percepções que tínhamos de mãe e pai, não raro
invertendo o que era de um e que atribuíamos ao outro.
Na língua de meu pai “El árbol” é
masculino. O que germinou o gosto pela escrita poética há alguns anos,
rabiscada aqui e ali, foi o surgimento do desejo de corte de uma linda paineira
que cortinava minhas janelas no quinto andar e ia além. Corte realizado muitos
versos depois, como ocorre com o espaço de adaptação ao luto, quando seres
amorosos se deixam acamar e devagarzinho vão se despedindo da gente até que nos
apiedamos de vê-los sofrer.
Denúncias formais foram entregues
aos órgãos responsáveis. Não sendo suficientes para aplacar o impulso vital, as
denúncias também ganharam versos livres, mais adiante publicados na internet.
Se a árvore mãe conduziu-me à sustentação, a árvore pai (paineira) legou-me a
poesia.
Talvez esse tantinho de
perspectiva tenha me deslumbrado às primeiras linhas e sido suficiente para
minha total simpatia com a obra do escritor francês premiado com o Nobel em
2008, quando o li pela primeira vez.
Trecho da apresentação do livro
“O africano”, de J. M. G. Le Clézio:
“Por muito tempo sonhei que minha
mãe era negra. Inventei-me uma história, um passado, para escapar da realidade
em meu retorno da África, neste país, nesta cidade onde eu não conhecia
ninguém, onde me tornara um estrangeiro. Depois descobri, quando meu pai, na
idade da aposentadoria, retornou para viver conosco na França, que o Africano
era ele”.
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