sábado, 17 de dezembro de 2011

Ovos Atemporais

Por Munique Duarte




Como se pisasse em uma caixa aberta com uma dúzia de ovos frescos. Pontada severa na têmpora. Tempos de azares, atitudes mal calculadas, água fervendo encostando a chaleira já estuprada na parede. Enfim, decúbito dorsal. Desafio o teto com o olhar fixo. Lembranças, ora amargas, ora doces, elas nunca se decidem. Mas o bom mesmo foi sair sem ver o fim da festa. Foi dizer aquelas palavras bem erradas na hora oportuna. Foi imaginar que ela seria água eterna de meu aquário. Sentir o calor do ar saindo de suas narinas pequenas. Arriscar-se. Levar um não. Insistir sempre quando a casa mostra sinais de rachaduras doentias. Nunca é tarde demais. Tentei. Quase.
Do que vale o contrário? Água é água mesmo fora de meu aquário de vidros ensebados. Experiências com humanos. Com humanas. Cortes de cena nas memórias desafiando o teto. Dores dorsais. Atemporais. O mais curioso é que não houve adeus. Nem piscadela derradeira. Texto sem ponto final. Talvez continue no próximo ícone a ser clicado. Ou não. Benefício da dúvida. Linda vestida de roxo. Roxo no meu maxilar que não calculou o peso de sua mão. E se ela estava travestida? Benefício da dúvida. Vigésima terceira tacada dada em falso em apenas 41 dias no total. Inferno astral. Não achei a pedra da lua para comprar na loja cheia de balangandãs e cheiro de mirra. Desprotegido. Mas, linda de roxo. Pra que ver fim de festa?
A festa foi do lado de fora. Queria que fosse do lado de fora do meu peito sem tatuagens. Mulheres ou travestis gostam de que tipo de atitudes, afinal? No final, dorso dolorido sobre a cama de colchão abaulado. De que lado você dorme? Posso fumar? Posso mais uma vez? De que jeito? Quanto tempo!
Talvez tenha sido bom, assim, afinal, sem ponto final. Talvez fosse frígida. Talvez não gostasse das rachaduras nas paredes. Hoje trago um tórax cheio de mágoas. Destemperado. Sem finalização. Queria um clique final e desligar a parafernália. Não refletir sobre a sorte ou sobre a sua amarga consorte. Arrisquei e assim fazem os bravos. Preciso pegar minha caixa de pontos finais. Quebrar as pontas das vírgulas. Preguiça de limpar as paredes do aquário.
Do decúbito dorsal para o decúbito frontal. Amanhã mais um dia amanhecerá para ser testemunha de ovos quebrados. Lâmpada do teto rachado queimada há meses. Medo deste eterno tempo mal passado. Linda de roxo. Imaginar de éguas pulando cerca. No meu peito ainda não tatuei ninguém.


Munique Duarte nasceu e vive em Santos Dumont-MG. É jornalista responsável pelas publicações de quatro sindicatos em Juiz de Fora-MG. Bloga em Textos Imperdoáveis. Participa da obra Escritos de Amor, lançada pela Casa do Novo Autor Editora, e Poesia e Prosa no Rio de Janeiro, da Taba Cultural. Já colaborou n'O BULE, Sobrecapa Literal, Escrita Criativa (Portugal), Revista Diversos Afins, Jornal Opção e Jornal Relevo. Admiradora de Dalton Trevisan, Lygia Fagundes Telles e Ferreira Gullar.

Um comentário :

  1. Obrigada mais uma vez pelo convite. Seguindo sempre as publicações do Texto de Garagem! ;))

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