Por Denise Fernandes
Um dia acordei chorando e
soluçando. Como se na terra dos sonhos eu já estivesse chorando. Foi muito
estranho. E o choro dizia que eu precisava publicar um livro. Foi o que
balbuciei chorando. Até hoje não sei por que tive que acordar chorando tanto.
Estava dormindo com meu namorado na época e ele achou muito estranho. Eu
também. Mas durante o dia, a lembrança do choro e a emoção que eu senti foram
se concretizando na ideia de que realmente eu precisava fazer um livro. Contei
para o namorado meu novo projeto. Jura? Você tem certeza? É naquela linha:
tenho que plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro para me sentir
realizado? Sim, é nessa linha mesmo. Respondi com um pouco de raiva, já
consciente de que ele preferia que eu tivesse a vontade (e o projeto) de uns
peitos de silicone para mim, do que o enorme desejo de escrever um livro.
Depois de duas semanas ele
foi viajar a trabalho e, quando voltou, disse que tinha pensado muito em mim na
viagem porque tinha conhecido um cara que escreveu um livro, e eles ficaram
conversando sobre o assunto. Ele disse que tinha contado ao novo conhecido do
meu projeto de livro; e que eles tinham tido uma conversa ótima, que ele iria
me contar os detalhes pessoalmente. Fiquei super feliz com a notícia. Meu
namorado me apoiando parecia tudo de bom. Sim, cheguei a pensar, nesse momento,
que ele devia ser sim o homem da minha vida.
Quando nos encontramos, chegamos
aos detalhes. O tal escritor editou um livro com três mil exemplares. Vendeu
meia dúzia de livros para a família e está lá com dois mil, novecentos e
noventa e quatro livros em sua casa, tomando poeira e lugar. Ele fala o tempo
todo do livro e parece um maluco, escritor amargurado, porém simpático,
querendo ser lido. E ele me perguntou com a maior cara de pau: é isso que você
quer para você? Ele me disse que enquanto conversava com o tal homem, pensava
em mim, no futuro, eu andando pelos bares e cheia de livros em casa, tomando
poeira e espaço. Ele me perguntou e eu não acreditei na pergunta: é isso que
você quer para você?
Quero meu livro. Não sei por
que quero, mas quero. Então, quero porque quero. Se eu não quisesse meu livro,
seria como se eu não quisesse a mim mesma. Mas, naquele momento, só falei a
ele. Você não precisa me ajudar no livro. Ele dizia: que livro? Por acaso você
escreveu algum livro? Alguém disse que seu livro é bom?
O livro não escrito saiu
brotando diante dessas palavras, como alimento. Fiquei com tanta raiva das
frases do tal namorado que não conseguia nem falar de ódio. Li em algum lugar,
em algum dia, que não devemos destruir os sonhos dos outros, porque não sabemos
o que esses sonhos carregam. Isso devia ser regra em relacionamentos afetivos –
quanto respeito se construiria com esse respeito ao sonhar.
Esse namoro acabou, o
livro cresceu e está crescendo, brotando como feijão no algodão molhado. Na
poeira dos livros de quem quer que seja que tenha escrito um livro, não está o
comércio de simples produtos; mas frutos de uma pessoa que resistirão ao tempo.
Cada livro espera o seu leitor (ou seus leitores). Cada livro é como um ovo que
o escritor botou. Imaginei, por muito tempo, eu sentada ao lado da tal pilha de
livros cheia de pó. Mesmo sendo uma imagem triste, já era o nascimento do
livro.
Outro dia sonhei que era o
dia do lançamento do livro e não conseguia chegar. Eu perdia o lançamento do
meu próprio livro. Num relógio antigo, batia sete horas da noite e eu sabia que
já tinha acabado o lançamento do meu livro. Que aflição senti no sonho. E
acordei com medo de realmente perder o lançamento do meu livro que nem está
pronto.
Livros para mim são de
extrema importância. O mundo não seria tão misterioso se não houvesse os livros.
Não consigo imaginar uma sociedade de paz sem amor aos livros, sem amor ao
amor. Sei que sou bobinha. E ser tão bobinha exige de mim muita coragem. Tomara
que seja coragem suficiente para escrever o livro que está brotando em mim.
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