domingo, 26 de agosto de 2018

Rainha

Por Oswaldo Antônio Begiato




Lembro o dia em que
minha mãe Regina,
(porque era Rainha mesmo)
pediu ao padeiro
sacos de trigo vazios.
(Parecia trazer para casa esperanças
que lhe restaram dos tempos de menina).


Em seu tanquinho de cimento
(que lhe roía as unhas e o tempo)
lavou-os bem
e alvejou-os com água sanitária forte.
Com cloro e sabão lhes tirou as letras
azuis e em círculo
que diziam terem eles vindos
da Moinho Santista.
(Os sacos, imensamente brancos,
pareciam pedaços de sua alma santa).


Com linha barata e costuras retas
as mãos repletas de carinho,
as pernas cheias de varizes
e os olhos felizes,
coseu na velha Vigorelli,
máquina de costura preciosa,
camisas raras para todos nós,
seus onze filhos.
(Eram o presente de uma mãe sofrida,
que parecia brincar de ser feliz).


Para as meninas
fez camisas femininas.
Para os meninos
fez camisas masculinas.
Em cada camisa,
no lado esquerdo,
o lado do coração,
colocou um bolso
e dentro do bolso
colocou, em segredo,
o que sonhava
para cada um de nós.
(Enquanto rezava uma prece
que mais parecia uma súplica sonhante).


A mim coube ser sacerdote.
Mas por absoluta falta de vocação
e excesso de desregramentos
fui ser poeta. Poeta menor!
(Na verdade eu queria mesmo é ter me saído
à sua parecença).

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