terça-feira, 21 de agosto de 2018

E se todos tivessem uma educação clássica?

Por Cesar Manieri



Hoje é domingo e domingo pede um cachimbo, então, como não fumo, peguei meu café e, entre um gole e outro, comecei a pensar sobre o motivo dessa profunda crise que nos afeta. Como diretor de uma pequena escola de apoio escolar, comecei a pensar sobre os porquês de estarmos profundamente afetados por uma educação tacanha e que levou nosso país à beira de um colapso econômico e social. Pensei nos motivos que nos deixaram à mercê de uma cultura que destrói a cada dia as coisas admiráveis que foram construídas por séculos e transformam nosso país em um amontoado de gente sem rumo.


Então, idealizei uma nova escola para nossos estudantes fazendo a mim mesmo a seguinte pergunta: e se todos tivessem uma Educação Clássica?


É uma boa pergunta, não é? E como uma boa pergunta merece sempre uma boa resposta, comecei idealizando como essa escola deveria ser para responder a essa intrigante pergunta. Pensei em grandes nomes de nossa civilização: Galileu Galilei, Willian Shakespeare, Charles Darwin, Martin Luther King, Albert Einstein, Thomas Jefferson, entre outros. O que esses grandes nomes teriam em comum? Certamente uma educação clássica.


Tenho certeza absoluta que muitos dos leitores não tem a menor ideia do que esse tipo de educação possa significar. Esclareço que esse foi o método onde muitos dos grandes e mais influentes nomes da história, inclusive os que citei aqui, foram educados.


Eu descobri a educação clássica por influência de um renomado professor, já falecido, chamado José Monir Nasser, que me apresentou postumamente, um livro chamado O Trivium (Gramática, Lógica e Retórica) e O Quadrivium (Álgebra, Arquitetura, Música e Cosmologia)  escrito pela irmã Miriam Josef e um outro livro chamado "A arte de ler" do autor Mortimer Adler. Quanto mais eu lia esses grandes livros, mais eu me convencia que essa deveria ser a educação ideal para as crianças de todo o país.


É um conceito de sucesso histórico comprovado e muitos educadores pelo mundo afora estão redescobrindo esse método como uma das mais efetivas maneiras de se ensinar as crianças.


Como sou pai de duas crianças de 5 e 9 anos, eu e minha esposa nos preocupamos com o tipo de educação que eles recebem fora de casa. Eles estudam em uma escola particular com boa reputação como bolsistas. Mas mesmo essas boas escolas estão sob o rígido controle pedagógico do MEC em matérias como: matemática, ciências, história, língua portuguesa, geografia, filosofia e ensino religioso.


É fácil perceber como os alunos das escolas particulares e estaduais não estão sendo academicamente desafiados e não aprendem os valores que nós consideramos os mais importantes para eles aprenderem. É muito frustrante isso, mas essa frustração faz todo o sentido.


Basta você ver os resultados dos testes destes mesmos alunos, comparados com de outros países e você verá que ocupamos as últimas posições no desempenho em matemática, ciências e leitura. Esses resultados são terríveis! Isso mostra que o ensino da forma como é hoje no Brasil é praticamente irrecuperável.


O país se depara hoje em dia com as dificuldades em contratar profissionais, melhorar o desempenho empresarial e governamental. Além disso, estamos perdendo jovens com grande potencial de sucesso para a violência e as drogas. Então eu me pergunto: quando foi que nossa sociedade se tornou tão repleta de violência que nos levou a perder praticamente nossa humanidade, nossa alma?


A escola que sonho em fundar, é aquela que ofereceria o tipo de educação clássica e que encontraria os pais desejosos desse tipo de ensino: o ensino de uma Escola Clássica. Muitos devem, agora estar se perguntando: "Mas que raios é uma Escola Clássica?"


Aprendi no livro "O Trivium" que a educação clássica começa com 3 matérias ou três estágios de aprendizado: Gramática, Lógica e Retórica. Na gramática o aluno aprende sua língua mãe, como uma ferramenta para entender as outras matérias que virão. Na lógica, ele aplica todos os assuntos aprendidos e, mais tarde, se foca na retórica onde ele aprende a se comunicar adequadamente. Todos esses estágios se integram perfeitamente com a progressão natural do desenvolvimento cognitivo dos alunos.


Nesta escola, os alunos aprenderiam a pensar de forma estruturada, pois crianças aprendem qualquer coisa com muita facilidade. Vejo isso em casa, com meus filhos, que conversam comigo sobre assuntos da literatura e das ciências com muita desenvoltura. Eles nunca se cansam de falar sobre planetas, velocidade da luz, ondas gravitacionais, estrelas de outras galáxias, histórias de reis e conquistadores, a vida de Jesus, histórias clássicas e fábulas.


Um outro aspecto da Educação Clássica, nesta hipotética escola, seria o uso de escritores clássicos logo no início do estágio gramatical. Os clássicos resistiram a ação do tempo. Possuem toda a sabedoria de gerações e são repletos de tanta riqueza de conteúdo que encanta as crianças que adoram lê-los.


Me deparo diariamente com alunos do ensino médio com uma caligrafia horrível e uma péssima compreensão do que leem, não só pela letra ruim que eles não entendem, mas por não saberem ler efetivamente. Na fase Gramatical, nesta escola, ensinaríamos a arte da boa caligrafia, por ela trazer benefícios cognitivos já conhecidos. O ensino do Latim seria parte do currículo. O Latim é a base de TODAS as línguas românicas, base da nossa própria língua. Os alunos que sabem Latim, tendem a apresentar um desempenho muito melhor em provas padrão, e ainda por cima, aprendem outros idiomas modernos com muito mais facilidade.


História é outra parte importante da nossa escola dos sonhos. Ensinaríamos desde a História Antiga até a Moderna sequencialmente, várias e várias vezes durante os 12 anos de estudos dos alunos. Priorizaríamos os estudos dos documentos originais, ao invés de cartilhas e apostilas, assim, os alunos estariam na verdade, lendo o que as próprias pessoas tiveram que pensar e dizer quando da ocasião dos fatos.


E sobre a fase Lógica?
Nessa fase os alunos estão curiosos e vivem perguntando o "porquê" ou "como" disso ou daquilo. Eles estão se tornando argumentativos. O objetivo da fase lógica seria: dar ao estudante uma compreensão profunda das matérias estudadas até aqui. Daríamos aulas de Lógica Formal, onde elas aprenderiam a arte da argumentação, aprenderiam argumentos formais e bem fundamentados reconhecendo falácias lógicas tão comuns nos dias atuais. Neste mesmo período, ensinaríamos aos alunos o processo de como escrever de verdade, tudo isso até o final do ensino médio.


Na fase Retórica, os alunos já estariam mais independentes. Com o que aprenderam eles já formariam suas próprias opiniões e começariam a se "separar" da família. Agora eles teriam as ferramentas dos assuntos e opinião própria, mas o mais importante é que eles entenderiam profundamente esses assuntos. Eles analisariam e sintetizariam as informações, formariam suas próprias opiniões embasadas em fundamentos sólidos, e seriam capazes de comunicar essas opiniões de forma efetiva e persuasiva.


Esse seria o grande tesouro que a nossa Escola Clássica daria aos estudantes. A capacidade de discutir profundamente o que foi estudado, onde eles poderiam aplicar a análise e a síntese imediatamente na vida real. Desenvolveriam argumentos baseados na razão e, depois disso, receberiam um treinamento formal em retórica, onde aprenderiam a arte de escrever e falar de forma articulada e persuasiva. Na Escola Clássica, o ponto mais importante seria que nossos alunos aprenderiam a aprender.


E os valores?
A Escola Clássica abordaria tanto a mente quanto a alma, a integridade do ser (Corpo, Coração, Mente e Espírito). Nutriríamos a alma com os valores e crenças Judaico-Cristãs. Jamais exigiríamos que nossos alunos fossem Cristãos. Os faríamos apenas entender a perspectiva Cristã e seus valores fundamentais. Exporíamos outras tradições de fé e assim eles seriam capazes de compreender outros pontos de vista do mundo.


Para muitos leitores, isso pode parecer fora da realidade atual. Mas sonhos foram feitos para serem sonhados. Estou convencido que se todas as pessoas da minha geração e da geração seguinte a minha tivessem estudado na Escola Clássica, viveríamos hoje em um país muito diferente e menos vulnerável aos mentirosos profissionais de plantão.


Os alunos, expostos a esse método, estariam aptos a frequentar cursos superiores em qualquer país do mundo e teríamos muito mais empreendedores e profissionais qualificados para desenvolver o país que queremos.


Na escola clássica, como dito anteriormente, nossos alunos aprenderiam como se tornar pensadores profundos e a falar de forma persuasiva e articulada, aprenderiam a raciocinar de forma lógica e a escrever bem. Aprenderiam a aprender.


Isso faria com que eles desenvolvessem o respeito pelos outros e por si mesmos, inclusive por aqueles que tem valores e crenças diferentes, mas sem tolerar a destruição das coisas admiráveis que nossa civilização conquistou. Internalizariam seus valores e teriam, com isso, uma orientação correta para tirar conclusões morais. Se tornariam responsáveis, confiáveis e aprenderiam a dar atenção ao mundo à sua volta. Eles desenvolveriam a força de caráter para agir com compaixão.


Agora, vamos voltar à pergunta inicial: como o mundo seria se todos de nossa cultura tivessem uma educação clássica?


Imagine como seria se todos estudassem na Escola Clássica. Pense nessas pessoas atuando nos gabinetes em Brasilia, no Senado Federal, nos governos estaduais, prefeituras, nas empresas, liderando grandes projetos, nos meios de comunicação de todo o país, nos sistemas de ensino, na nossa vizinhança. Como seria a nossa sociedade? Faça uma reflexão.


Cidadãos que saberiam sua história verdadeira, de forma tão profunda que isso evitaria os erros do passado. Cidadãos que tomariam suas decisões baseados na razão e não apenas na emoção, e que reconheceriam as mentiras de modo que não poderiam ser enganados ou manipulados. Cidadãos capazes de expressar seus pensamentos e ideias de forma articulada e convincente através de debates respeitosos, ao invés apenas de denegrir aquele de quem discordamos. Isso seria uma mudança prazerosa no cenário das diferentes áreas da interação social.


Qual o tipo de educação vocês querem que nossos futuros líderes tenham? E seus próprios filhos, a educação escolar que eles recebem hoje, está adequada para a construção do país que queremos? Pense nisso.


Eu sei que a Educação Clássica funciona. Ou vocês acham que a educação atual, que temos nas escolas, é um mero acaso?

É engenheiro, músico, empresário, professor e
especialista em educação matemática.
Também é diretor da escola Integro.
Escreve em seu blog Na Metade do Caminho.

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