quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Roberto manda notícias

Por Amilcar Neves*

 
Em verdade, quem mandou notícias do Roberto foram os gêmeos de Videira. Ficcionista tem desses vícios de profissão: sempre distorce, muda, altera, "melhora" algo na realidade para tentar dar algum sentido e levar algum interesse ao que escreve. Assim, anuncia em letras grandes que Roberto mandou notícias para, em seguida, dizer que os arautos foram Claudinei e Claudionor.
 
Os dois irmãos só não são siameses: idênticos em tudo, desde o físico até o intelectual, desde o mental até o espiritual, estão sempre juntos. Quando conversam, cada qual invariavelmente diz a metade da frase, deixando ao outro que a complete. E o complemento de um é sempre o que o outro estava mesmo querendo dizer. Usam o artifício, que já passou a integrar suas personalidades, mesmo quando conversam entre si, o que não param de fazer. Para eles, é curioso ver as pessoas falarem frases inteiras, completas e acabadas. Parece-lhes, este, um expediente estranho de quem talvez se sinta muito solitário, sem alguém que lhe complete o pensamento e a vida.
 
Às vezes, de brincadeira, eles se apresentam a novos vizinhos como Claudionei e Claudinor. Fazem isso só para se divertirem um pouco, confundindo as pessoas e dificultando-lhes a identificação de qual deles não é o outro.
 
Pois os gêmeos da bela cidade de ladeiras íngremes mandam dizer que Roberto é um frequentador assíduo da biblioteca municipal de Videira, no Meio-Oeste catarinense, da qual faz de um livro um dos mais retirados do acervo. Aliás, esclarece Claudinei, Roberto é a única pessoa que pede o livro..., e completa Claudionor: Rádio Digital, que nunca ninguém mais quis ler.
 
Informam mais, os dois: Roberto está copiando a mão o livro todo, por isso que precisa retirá-lo e devolvê-lo, por decurso de prazo, tantas vezes. Por que ele não diz que perdeu o livro, ressarce a biblioteca com outra obra mais procurada pelos leitores e fica de posse definitiva desse seu livro de cabeceira?, insinuam os gêmeos. O fato é que Roberto não perde palestra na cidade, concedendo ao orador uma tolerância de cinco minutos: se ele não for enfático e claro nas palavras, dá-lhe as costas com desdém e vai embora. Do contrário, pega dele um autógrafo ao final da fala, entusiasmado com o desempenho.
 
Nuves, da biblioteca, é quem decifra o enigma: quando for grande, Roberto quer muito ser locutor de rádio.

*Conto publicado no jornal "Diário Catarinense" de 22.12.10

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