terça-feira, 28 de abril de 2020

Escravos da escolha

Por Maurício Perez



Orgulhosos de viver na era da informação, preferimos que alguém pense por nós. Nada de ler textos do próprio autor. Preferimos a notícia que o Papa Francisco acabou com o pecado, a conferir a suposta homilia. Orgulhosos do acesso a qualquer informação, preferimos os vídeos de cachorros fofinhos (e memes da internet) do que ler algo sério.


O problema não é apenas preguiça ou superficialidade. Há outra questão mais importante e séria: como selecionamos e formulamos nossas opiniões. Se não simpatizo com a ideia do pecado, minha tendência é ler a manchete "O pecado acabou" e usá-la como prova irrefutável de que estou certo. Ao mesmo tempo, evito ler outra manchete que afirma o contrário. "Não é interessante e deve estar errado". Assim, de grão em grão, vamos nos fartando de ideias pré-concebidas e equivocadas.


George Loewenstein, Russell Golman e David Hagmann, da Carnegie Mellon University, publicaram um artigo na Journal of Economic Literature sobre essa tendência. Mostram que, inconscientemente, usamos a estratégia de procurar a informação que nos agrada e, não só evitamos, como esquecemos a informação que nos contraria. Deve ser por isso que os homens esquecem o aniversário da sogra...


As pessoas frequentemente evitam ir atrás daquilo que pode ajudá-las a tomar uma decisão mais acertada; se entendem que esse conhecimento será doloroso e/ou pode complicar suas vidas. Professores acomodados, por exemplo, poderiam se beneficiar dos comentários de seus alunos, mas evitam as críticas - para não ficar evidente que precisam melhorar. O mesmo fazem os gerentes "bronca e esporro" com seus subordinados. Bem como os fiéis, quando buscam um padre ou pastor que fale algo reconfortante, mesmo à custa da verdade.


E aqui também entram as interpretações forçadas. O aluno é capaz de encontrar as mais inusitadas desculpas para validar sua resposta errada na prova. Jornalistas e intelectuais juram que o usuário de drogas não financia a violência urbana. O pai e a mãe se convencem que o melhor é trabalhar exaustivamente para enviar o filho pequeno a um bom colégio (mesmo à custa de estarem pouco presentes em sua vida).


Quando a verdade não dói, desconfie.

É autor do blog Correio Chegou.

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