Por Maurício Perez
Há um livro que ainda não chegou no Brasil intitulado "So good they can’t ignore you", de Cal Newport. Os livros de auto-ajuda padecem de três defeitos graves: reescrevem o passado para bater com sua teoria, vendem soluções fáceis, vendem uma técnica que irá resolver tudo. Não é o caso deste livro e por isso vale a pena falar um pouco dele.
Por que algumas pessoas amam o que fazem e outras não? Uma razão possível é que as últimas caíram na armadilha da paixão. Querem fazer algo que gostam e como o gosto é volúvel e tendemos a nos enjoar do que provamos em excesso, rapidamente caem na frustração. Mudam várias vezes de faculdade, de emprego, de ocupação a procura de algo que as encante.
É preciso primeiro ser bom naquilo que se faz antes de tirar algum gosto do trabalho. Adquirir expertise exige esforço, constância, estudo, relevar estados de ânimo, enfrentar dificuldades, restrições. Pouco a pouco, chega-se a dominar o assunto. Percebe-se a eficácia e os frutos do que fazemos, do serviço que prestamos aos demais e a sociedade. A cozinheira precisa praticar muito para saborear o triunfo da arte culinária. O piloto de excel também.
Claro que se tornar um expert não traz em si a felicidade. Basta pensar nos workaholics. Mas, certamente que um trabalho feliz não reside na paixão. O problema é que nos convenceram desde a mais tenra idade que sentir é tudo. Além disso, as últimas gerações foram criadas com mimos, muitas opções de estudo e carreira e uma expectativa muito alta do mundo do trabalho. Foram inculcadas a pensar que são indivíduos com talentos especiais e que encontrarão um trabalho desafiador e excitante. Foram doutrinadas a pensar que o trabalho – a própria vida – deve ser uma aventura, um espaço para a expressar a identidade e ser reconhecido. Não é bem assim.
Perguntaram a milhares de universitários canadenses quais eram suas paixões. O resultado da pesquisa apontou as cinco maiores paixões: dançar, hockey no gelo, esquiar, ler e nadar. De fato, essas paixões não tem muito a ver com o mundo do trabalho (com exceção da leitura). E eles pensam que lá fora há um certo emprego para o qual foram feitos, um emprego que encaixa perfeito com seu jeito de ser. Resultado: há trinta anos o índice de satisfação com o emprego nos EUA vem decaindo. Apenas 45% dos americanos estão satisfeitos com seu emprego atual.
Quando você fica pensando no que o emprego oferece, maior a chance de reparar nos aspectos que não agradam, o que leva a um estado de insatisfação crônica. Isso é especialmente verdadeiro no início da vida profissional, onde as tarefas diárias tendem a ser monótonas e não há bons hábitos consolidados.
Seria melhor inculcar nas pessoas a mentalidade do artesão. Faz seu trabalho um dia e outro; aos poucos aprende e adquire maestria. A paixão se desprende então como fruto maduro. Não comece pela paixão. Termine por ela.
É autor do blog Correio Chegou.
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