terça-feira, 14 de maio de 2019

Ao escolher emprego, não siga sua paixão

Por Maurício Perez



Há um livro que ainda não chegou no Brasil intitulado "So good they can’t ignore you", de Cal Newport.  Os livros de auto-ajuda padecem de três defeitos graves: reescrevem o passado para bater com sua teoria, vendem soluções fáceis, vendem uma técnica que irá resolver tudo. Não é o caso deste livro e por isso vale a pena falar um pouco dele.


Por que algumas pessoas amam o que fazem e outras não? Uma razão possível é que as últimas caíram na armadilha da paixão. Querem fazer algo que gostam e como o gosto é volúvel e tendemos a nos enjoar do que provamos em excesso, rapidamente caem na frustração. Mudam várias vezes de faculdade, de emprego, de ocupação a procura de algo que as encante.


É preciso primeiro ser bom naquilo que se faz antes de tirar algum gosto do trabalho. Adquirir expertise exige esforço, constância, estudo, relevar estados de ânimo, enfrentar dificuldades, restrições. Pouco a pouco, chega-se a dominar o assunto. Percebe-se a eficácia e os frutos do que fazemos, do serviço que prestamos aos demais e a sociedade. A cozinheira precisa praticar muito para saborear o triunfo da arte culinária. O piloto de excel também.


Claro que se tornar um expert não traz em si a felicidade. Basta pensar nos workaholics. Mas, certamente que um trabalho feliz não reside na paixão. O problema é que nos convenceram desde a mais tenra idade que sentir é tudo. Além disso, as últimas gerações foram criadas com mimos, muitas opções de estudo e carreira e uma expectativa muito alta do mundo do trabalho. Foram inculcadas a pensar que são indivíduos com talentos especiais e que encontrarão um trabalho desafiador e excitante. Foram doutrinadas a pensar que o trabalho  a própria vida  deve ser uma aventura, um espaço para a expressar a identidade e ser reconhecido.  Não é bem assim.


Perguntaram a milhares de universitários canadenses quais eram suas paixões. O resultado da pesquisa apontou as cinco maiores paixões: dançar, hockey no gelo, esquiar, ler e nadar. De fato, essas paixões não tem muito a ver com o mundo do trabalho (com exceção da leitura). E eles pensam que lá fora há um certo emprego para o qual foram feitos, um emprego que encaixa perfeito com seu jeito de ser.  Resultado: há trinta anos o índice de satisfação com o emprego nos EUA vem decaindo. Apenas 45% dos americanos estão satisfeitos com seu emprego atual.


Quando você fica pensando no que o emprego oferece, maior a chance de reparar nos aspectos que não agradam, o que leva a um estado de insatisfação crônica. Isso é especialmente verdadeiro no início da vida profissional, onde as tarefas diárias tendem a ser monótonas e não há bons hábitos consolidados.


Seria melhor inculcar nas pessoas a mentalidade do artesão. Faz seu trabalho um dia e outro; aos poucos aprende e adquire maestria. A paixão se desprende então como fruto maduro. Não comece pela paixão. Termine por ela.

É autor do blog Correio Chegou.

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