sexta-feira, 16 de março de 2018

Fios

Por Mayanna Velame




Sim, eles chegaram. Eis que surgem em nossas vidas, sem pedir licença. São teimosos. Disfarçá-los é uma tarefa árdua. Algumas pessoas, naturalmente, conseguem aceitá-los. No meu caso, no entanto, há uma nítida relação de amor e ódio.


Não me recordo, com precisão, quando eles apareceram. O que me cabe é consentir com sua existência. E por mais que eu tente, sei bem, estarão todos lá  livres, leves e soltos.


Homens e mulheres, ninguém pode detê-los! A força reside e vive neles. São intrusos qualificados em persistência.


Timidamente, apresentam-se entre as mechas escuras da minha cabeleira (para, assim, reluzirem nas têmporas). Cabelos grisalhos são os fios do tempo que se sobressaem. Aceite isso, leitor.


De algum modo, na vaidade feminina que sustento, ainda tento pinçá-los ou tingi-los. São retocados todos os meses, com legítima fidelidade e pontualidade. Entretanto, os cabelos brancos sempre vencem.


É interessante ver a divindade do tempo se materializando em nós. A fonte da juventude só existe mesmo nos desenhos animados. E o pincelar da vida não será eternamente contornado em cores vivas e vibrantes.


Nascemos, crescemos, vivemos. A cada dia, nos sensibilizamos com as limitações que o corpo, paulatinamente, se torna refém. E esses famosos cabelos brancos, de certa forma, reafirmam a certeza da nossa brevidade.


Olho-me diante do espelho. Penteio meus cabelos, na tentativa de esconder os tons esbranquiçados. É uma ação que executo sem sucesso: os fiapos cor de neve reaparecem. Eles despontam; sinalizando que o viver corre ao sabor da natureza. Sorrio num instante. O olhar pesado e a face perdida exibem, sem censura, os traços dos anos  nos ângulos do meu rosto esquálido.

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