domingo, 22 de maio de 2011

A Literatura de Cordel e a Comunicação

Por Fabiana Siqueira


A informação transforma o ser humano em agente participativo da sociedade no mundo contemporâneo. Por meio dela, é possível interagir, expandir o pensar e compreender todos os assuntos que norteiam a vida. Com os meios de comunicação vivendo momentos de grandes transformações – principalmente pelo advento das redes sociais –, a informação tem se tornado, cada dia mais, um produto necessário para a sobrevivência humana.

Dentre os diversos e mais antigos veículos em que a comunicação está presente, destacam-se o jornal impresso e os folhetos de literatura de cordel (mais conhecidos e popularizados na região norte e nordeste do Brasil). Em um primeiro momento, os dois estilos literários podem parecer opostos, contraditórios e/ou não apresentar nenhuma relação entre si. Porém, depois de um olhar mais criterioso, muitas semelhanças e conexões se instalam: tanto na maneira como são produzidos, quanto na forma com que são disseminados.

A relação de reciprocidade de ambas as produções dizem respeito também às pautas e aos mecanismos utilizados para a persuasão do público leitor. As matérias produzidas nos principais jornais impressos diários do país apresentam decorrência de acontecimentos – sendo estes os principais assuntos debatidos e pensados pela população.

Esse agendamento dos temas está presente também nas abordagens feitas nos folhetos de cordel que, por vezes, trazem assuntos discutidos pelos populares (como crítica social e política, textos de opinião pública e atualidades em geral). Em setembro de 2001, uma semana após os ataques terroristas ocorridos nos Estados Unidos, já circulavam nas mãos do público mais de dez exemplares diferentes de cordéis tratando sobre o ocorrido.

A periodicidade de uma publicação permite uma maior continuidade nos temas abordados e sua ligação com o dia a dia do povo. Para os jornais impressos diariamente, essa é uma regra que permite a fragmentação da notícia. A maioria das edições apresenta editorias distintas, como economia, esporte, cultura, saúde, entre outras, às quais enfocam a notícia principal de cada tema. No caso do cordel, a periodicidade não é pré-estabelecida. Mas essa regra não o distancia do jornalismo diário. Apesar de relatar histórias de ficção e de grandes ícones históricos, o cordel também atinge textos factuais; com valores de utilidade pública.

Encontra-se nessa categoria um folheto de Mestre Azulão, do ano de 2004, cujo título é “Camisinha para Todos”. Ele busca, em seus versos, esclarecer sobre os perigos da Aids e os preconceitos que a população tem ao mencionar a doença. Em uma passagem do texto, ele constata: “Aids não pega no beijo/ Nem no aperto de mão/ É transmitida no sangue/ Através de transfusão ou na extração de dente/ Se usar de um doente/ A agulha da injeção”.

A literatura de cordel apresenta-se como um híbrido de linguagem, fundindo-se com a poesia popular originalmente cantada por repentistas e violeiros. Depois, esse estilo literário ganhou as páginas dos folhetos rústicos – apresentados juntamente com ilustrações de xilogravura.

Outro artifício utilizado pelos dois veículos de comunicação é a criação da notícia como forma de espetáculo. Tanto as fotos dos jornais (como a arte em xilogravura impressa nos cordéis) chamam a atenção do público para o tema proposto, em complemento aos títulos, procurando atrair o leitor para todo o conteúdo e tornando a informação mais atraente para quem abrir um jornal ou folheto. Segundo o jornalista Alberto Dines, em seu livro O Papel do Jornal, uma foto publicada é um investimento em espaço e dinheiro. “Foto que nada transmite ao leitor é um prejuízo”, pontua.

Devido a uma maior disseminação nas regiões norte e nordeste do país, os autores de cordéis – que também fazem parte desta cultura – optam, muitas vezes, por escrever seus versos em linguagem de matuto (como é popularmente conhecida a maneira de falar do nortista ou nordestino). Os cordelistas estruturam os textos como poemas rimados, com suas estrofes curtas, para criar uma linguagem que melhor se identifique com essas populações.

Contudo, não podemos deixar de observar a riqueza dos versos da literatura de cordel como uma representação da arte popular e do folclore brasileiro. Sua criação funciona como uma extensão do pensar de nosso povo; assim como o jornal representa o direito à informação de todos. Por mais que essa forma de expressão ainda utilize alguns mecanismos arbitrários, só a população, tendo acesso a ela, poderá interagir e alterar esse meio – criando um novo caminho para a expansão da comunicação e da informação.

Um comentário :

  1. Fabiana Siqueira acabo de ler seu artigo no Texto de Garagem, mas há três equívocos a saber: associando o cordel apenas a xilogravura na ilustração, que o cordel utiliza a linguagem matuta e que o cordel teria vindo dos cantadores repentistas. Poesia matuta é uma coisa totalmente diferente do cordel e nenhum clássico do cordel é feito nessa linguagem. A poesia matuta é um ramo dentro da grande árvore da poesia. O cordel começa a ser feito sem capa, a xilogravura entra nessa arte na década de 50 e o cordel não é mesma coisa do repente, não veio dele, pois embora se pareçam na composição, estão distintos por exemplo, na sextilha, que no repente é obrigado o uso da deixa, no cordel não é. Quem fez muita poesia matuta foi Patativa do Assaré que nunca se assumiu como cordelista, aliás fez apenas cerca de 12 cordéis que não chegam a ser clássicos dessa literatura. São esses três equívocos, mas fora disso está interessante.
    a

    ResponderExcluir