terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Carta a Dilma

         Por Denise Fernandes


       Aqui do meu canto tô achando as questões políticas cada vez mais complicadas. Depois que o Collor conseguiu se eleger pelo voto pós processo de "impeachment", me arrependi de ter ido ao evento "Diretas Já" em mil novecentos e bolinha. Para quê ter brigado com meu pai, minha mãe? Ter ficado tensa e com medo? O evento fedia a pinga. A gente aplaudia quando todo mundo aplaudia. Meu namorado fazia quase que uma escolta em mim, para que ninguém me “encoxasse” ou passasse a mão na minha bunda. Acho que eu não precisava ter dado essa contribuição para o movimento democrático. Podia ter ficado namorando em casa. Porque há uma democracia que nunca aconteceu e só existe nos planos da gente mesmo.

       Na televisão, um policial diz estar negociando com estudantes numa manifestação. Diz que eles têm cinco minutos para sair dali. Depois, avança com suas tropas de forma violenta. Meu pai me ensinou que, para negociar, é preciso ouvir os outros e também pensar. Achei muito estranha essa forma de negociar do policial.

       A polícia é questão nas conversas, matérias. Quase sempre se pede mais policiamento. Fico confusa: a sociedade tem dinheiro para isso? Para policiar tudo? Essa é realmente a saída?

       Tem mais coisas esquisitas nas discussões envolvendo a polícia. Por que só agora a questão de policiar a USP? No período todo em que estudei lá, a USP era considerada um território bem perigoso em alguns lugares para mulheres sozinhas (pela questão de estupro). Eram boatos? Ou estupro é crime menor, não merece policiamento?  Ou não merece atenção e policiamento porque se estupram mulheres e não homens? Também é esquisito, sempre achei que a USP fosse policiada e que não havia policial para se cobrir toda a necessidade da cidade de SP. Agora tem policial sobrando e dá pra cobrir tudo? Antes a USP não era policiada e eu estava ali dando sopa prá bandido e ninguém se interessou?

       E a Dilma, como se sente vendo pela TV a polícia reprimir estudantes de forma violenta em manifestação? Ou ela não vê? Toma um uísque nessa hora e, mais tarde, um remédio prá dormir. Porque acho que a senhora presidenta possa não estar vendo. Por isso mesmo, resolvi escrever essa carta. Um amigo me disse que escrever na internet é como colocar uma carta numa garrafa no mar. Mas outro dia vi pela internet mesmo que uma pessoa achou, depois de muitos anos, uma mensagem jogada ao mar. Por isso escrevo essa cartinha, querida presidenta. Por favor, ponha a mão na consciência e proíba a polícia de reprimir os movimentos populares pacíficos. Ao contrário, mande emissários para ouvir os que se manifestam.

       Outra questão está levando a uma contradição política que nos deixa sem saída para o entendimento. Se temos um problema de saúde muito maior com o álcool do que com o crack, porque decretamos guerra ao crack e permitimos a venda do álcool até dentro do estádio na Copa? Não dá para dizer que a deterioração de um dependente de álcool são menores que a do crack. Não seria de coerência mínima também se investir na questão do álcool? Ou isso não é investimento relevante, não estamos sendo levados a uma situação de evolução, mas sim de contínua enganação... Será que o crack, o álcool e as drogas são os grandes vilões da civilização? Será que as drogas devem ser responsabilidade do poder público? Será que o poder público não deveria estar investindo seus esforços numa guerra contra o analfabetismo, contra o abandono, a falta de esgotos e de situações sociais positivas?

       Só de pensar, já resolvo que não vou votar na próxima eleição e me arrependo de ter ido no "Diretas Já". Devia ter começado a escrever cartas naquela época. Antes tarde do que nunca, prossigo, querida presidenta.

       Um dia desses apareça aqui em casa para tomar um café. Como políticos populistas de outrora, faça a cena de pertencer ao povo. E, por favor, não faça cirurgias plásticas desnecessárias. Porque precisamos dessa alegria.

       Em nome da Alegria, te peço também um novo uso das mídias eletrônicas. Uma televisão menos comercial e mais expressiva.

       Essencialmente, querida presidenta, seja muito generosa, bondosa, amorosa e verdadeira. Seja um exemplo. Estamos juntas.

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